sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Pausa para descanso


Aproveite o recesso de fim de ano...

E quem disse que eu consigo... O tédio mata... Prefiro o tédio coletivo ou o tédio com paixão. Mas como tédio coletivo é cada vez mais raro nesses tempos onde precisamos agendar por msn com os vizinhos uma simples visita e o tédio com paixão, este sim, é mais raro ainda, andei sublimando tudo, agitando algumas coisas políticamente(citar a palavra"políticamente" torna metade do texto chato e a outra metade desinteressante).

Tentei pensar no próximo ano, mas não dá. Só se pensa caminhando, eu aqui parado mal consigo pensar. Sonhar eu consigo, sonho bastante, demoro a tomar atitudes, prefiro ficar no zero a zero, sem complicar as coisas... mas as pessoas gostam de coisas/pessoas complicadas.

Então, boa sorte. Prefiro não entrar/aprofundar nesse assunto, só quero ficar aqui, sentado neste banco, deixando as idéias fluírem, por que a solidão pode até ser algo ruim para uma sociedade que caracteriza a si mesmo como barulho/neon/luzes coloridas, mas foi na solidão que eu consegui realmente encontrar a porta do meu inconsciente. Não é uma boa viagem, mas é melhor do que nunca ter viajado... muito melhor... Eu não fiz nada de muito interessante entre segunda-feira e sexta-feira. Um espaço grande, mas eu fui obrigado a parar. E parar requer auto-controle quando se está acelerado.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Se jesus tivesse nascido hoje

Se jesus nascesse hoje, nasceria num assentamento rural, numa ocupação urbana, numa comunidade Zapatista, num squat anarquista na europa, numa favela da zona sul do Rio de Janeiro, numa comunidade indígena expropriada pelas multinacionais da celulose. Se jesus tivesse nascido hoje, nasceria negro, pobre, indígena, sem-teto, sem-terra, ecologista, anarquista, magónista, desempregado, zapatista, libertário, piquetero, quilombola, squatter, anti-capitalista.

Sem consumo não há cidadão no capitalismo. O capitalismo constrói sua cidadania baseada no poder de compra, no capital investido, na soma adquirida.

Se jesus tivesse nascido hoje, teria sido assassinado pela fome, pela desnutrição, pela miséria, pelo desemprego, pela falta de saúde, de remédio, de casa, de educação. Teria sido assassinado, pela falta de água, pela falta de recursos básicos. Teria sido assassinado pelas milícias paramilitares, pelo BOPE, pela polícia, pela política institucional.

Se jesus tivesse nascido hoje, provávelmente ele choraria... Choraria....

E não comemoraria este natal do consumo.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Sobre o desafio

Realmente não consegui completar o desafio de escrever 21 contos / poesias, até o dia 21 de dezembro. Mas convenhamos que eu me esforcei, aliás fiquei uns 3 ou 4 dias sem internet, e eu só funciono bem quando escrevo on-line na maioria das vezes. Apesar disso, extendo o desafio até o dia 31, afinal esta fase produtiva é realmente motivadora.

Sobre os aniversários


Ruiva, escrevo em tom de cansaço. Em tom de cansaço, por que(e não usarei "de certa forma" antes desta frase ou antes do por que, ou antes dos subsequentes parágrafos) você é a primeira e a última pessoa que eu posso conversar. Todos, todas falharam, e você sabe que eu não sou tão perfeccionista assim. Sabe também que neste "todos" há pequenas exceções, pequenas grandes exceções para pessoas muito especiais; conquanto, pessoas especiais precisam provar que realmente são especiais, e isto não se faz com um, ou dois quartos de século ruiva, isto se faz diáriamente, isto se faz cotidianamente.

É difícil ser especial, eu admito. Na verdade na maioria das vezes acham realmente que eu, eu, o pseudo-ruivo, proto-moreno ruiva, ou incorporo metade daquele irritante joguete do "aceito qualquer coisa" , como um falso Gandhi ruiva, e Gandhi não aceitaria qualquer coisa, ou apenas tenho uma capacidade extrema de não me importar, não me importar como um beatnik sulamericano, de perdoar, de perdoar ruiva, de perdoar com todas as minhas artérias, sem que para isto eu realmente precisasse de sangue correndo em minha veias; e para quem não quer suportar mais nada emocionalmente tão exasperado, eu não tenho sangue correndo nas minhas veias ruiva, não, não tenho.

Não depois de você ter me feito de palhaço ruiva, um palhacito ruiva, um palhaço indisponível, um palhaço desprezívelmente raso, razoável.

Mas faz parte ruiva, faz parte do meu metafísico destino, um destino previsível, não pelo que eu construí, mas pelo que ele efetivamente constrói, mesmo não me imaginando tão determinista, é um fato concreto, de que este destino de merda, constrói-se a si próprio, a mim próprio, num casulo de previsibilidade tão constante, que vez ou outra eu me pego perguntando-me se há solução para este paradoxo.

Não há. Não há solução. A solução é eu me completar. Mas isto trairia todos os meus princípios, pois não há completude no alheio, segundo meus princípios ruiva, princípios tão bonitinhos ruiva, tão belos, tão obesamente preenchidos de vigor, são tão belos, são verdadeiramente lindos! Lindos ruiva! Do tipo em que se aperta e não se enxergam defeitos!

Mas ruiva, há os poréns, e os poréns normalmente enterram, mesmo que seja em breves segundos tudo o que é bom e perfeito ruiva. É no porém que se enterram mundos, é na vírgula que se enforcam princípios e embalsamam-se eras. É na incompletude das brevidades que se assiste o fim de ciclos, ciclos movidos a cachorro quente sem salsichas, sem carne ruiva, na esquina da avenida Mem de Sá. Eu pareço(e sempre tive este talento) estar sempre imerso em determinadas atividades ruivas tão intensas, tão recheadas de vida, de clamor, de emoções, de histórias que se desdobram em mesas de bar, em copos vazios, em encontros casuais ou em carteiras vazias, mas a verdade ruiva, é que meu talento é apenas esmiuçar das letras algo que valha a pena, é enforcar a monotonia da rotina neste balé literário gramatical; o que causa a impressão de que a cada carta que eu escrevo a você(s) há uma supernova em explosão, há um vulcão enterrando civilizações emocionais, há um genocídio literário autorizado, quando na verdade é mero balé ruiva, é mera capoeira, é mero gingar de corpos, digo na verdade, de frases.

Sou talentoso com letras(um complexo psíquico autônomo insiste o contrário), não com pessoas. Devo todas as minhas condolências a Kafka, Oscar Wilde, Clarice Lispector, Cortázar, Lima Barreto, João do Rio e diversos amigos ilustres, e não-ilustres(os não-ilustres são os que mais me inspiram). Prefiro não morrer de tuberculose, apesar do que tenho a incrível habilidade de me resfriar, e me adoecer sempre em datas importantes.

Termino a carta imaginando se um dia será possível, olhar para trás, cinquenta anos atrás, não como meu 1/4 de século ruiva, mas como uma metade de século e tentar enxergar algo ou profético ou nostálgico nisto tudo ruiva. Será possível?

Talvez ruiva, talvez, falei exasperadamente de mim, de minha pessoa, mas devo dizer no finalzinho da conversa e da carta(já que o papel está acabando), que você e seus malditos jogos de xadrez emocional não irão me vencer.

Quem topar o desafio(e para isto deverá comer argumentos de ruivas no café da manhã), me ganha.

Não tenho talento para troféu; mas posso tentar me vestir de dourado.


quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Um preâmbulo de um pequeno desastre

Quando eu fui buscar aquelas cartas, eu já sabia, já tinha total certeza, toda completude moral, de que você não iria mais me escutar, mesmo eu tendo designado metade do meu tempo na terça-feira a noite para esculpir desculpas para ti.

Eu falhei, é vero. Gostei e tive ainda mais certeza, quando eu percebi que você não me chamava mais impessoalmente. E me chamar impessoalmente era algo tão íntimo, mas você resolveu me chamar pelo meu nome, e isto era um mau sinal, sim era um mau sinal. Um tremendo desastre particular.

Você já me ignorava há algumas semanas, e o fato de não responder minhas cartas, já indicava de certa forma que estava curada.

Sim, curada. Do ponto de vista médico-amoroso, você já podia fazer noventa ou noventa e cinco de suas atividades habituais sem pensar em mim, eu não estava mais nos seus sonhos, não aparecia dentro dos seus pensamentos perdidos no domingo a tarde e muito menos acabava com algum final de semana seu. Eu já era e já tinha sido realmente. Falimos(fui eu que fali na verdade) emocionalmente, e você é claro, percebeu da forma mais cruel e terrível o quanto foi possível.

Cruel por que sabia que esta era uma bela faca de dois gumes, e que eu ia demorar no mínimo de duas a seis vezes o que você demorou para esquecer. Ignorando todas as expectativas dos meus amigos temporários, amigos porções únicas, eu voltei a lhe escrever após saber que já era parte do seu passado, eles aconselharam, comentaram, e até me ignoraram demasiadamente, antes de nós, eu digo nós, termos conseguido chegar ao ponto preciso em que alguém deve perder.

E é claro que fui eu. Não que o amor seja um jogo de competição, pois eu particularmente odeio, aqueles que fazem do amor, um simples jogo de domínio ou poder...

O amor ultrapassa toda as fronteiras, mas ele é cruel demasiadamente com pessoas indecisas. Por que para o amor não há indecisão, e isto é por demais totalitário, mas de certa forma faz sentido no final de tudo, e de todos.

Faz mais sentido diante meus sonhos estranhos. Sonhei que a antiga casa da minha avó pegava fogo. Eu salvava minha mochila, mas só depois dos bombeiros chegarem, eu consegui apagar o incêndio todo. Gostaria que fosse assim todo o momento. Não foi tão fácil, mas o caminho estava lá.

Por enquanto encerrarei, até por que tenho uma meta a cumprir.

Vejo-lhe nos sonhos e nas minhas memórias.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Bruxos - volume 01

Ontem ele deu um grande passo na sua jornada, na sua vida. E foi aí, depois do sétimo dia, que a magia surgiu e que ele virou um bruxo. Um botão de flor foi capturado, a lua se escondeu atrás das nuvens e ele percebeu que sua magia poderia realmente funcionar. Mas falar de magia num mundo cinzento não era algo de gente sã. Gente sã quer medidas não-radicais. Gente sã gosta de economia no café da manhã e dirige carros movidos a diesel por auto-estradas de fim de semana.

Gente sã compra carne de vitela, uma espécie de jesus cristo dos animais e se masturba assistindo a tv digital.

Ele andava a passos curtos. Pequenos passos para um homem, para um bruxo, mas um grande passo para o inconsciente, para a teia do universo, para a magia em si.

Demorou a dormir, por que foi o preço a se pagar, um preço visívelmente estúpido, mediante todo o processo desencadeado.

Jorrou recordações em doses grandes e geladas; como agua límpida e gelada, afinal as memórias ruins normalmente são claras, límpidas e frias. A bruxaria não; é quente, calorosa e turva, como a rebeldia e a revolta tem de ser.

Caminhou bastante, caminhou bastante, enchendo a semana de sentido, para ver as lembranças se aglutinarem. Está tudo muito límpido para o bruxo.

Límpido de sentido: se há algo escondido, é por que realmente ele acha que precisa estar lá.

Talvez fique por toda sua vida.

Um pequeno insight causou um verdadeiro efeito dominó, pequenos desastres cotidianos, derrubar café na mesa, cair açúcar no tapete, deixar as moedas fugirem pela estação do metrô, mas que cena patética; não esqueça o troco da condução bruxo, o troco da condução, pegue aquela moeda lá, aproveite que a falsa-ruiva da esquerda não está olhando bruxo, aproveite que o senhor de terno laranja parou de jogar malabares em frente a máquina de refrigerantes.

Acionou mecanismos secretos e trouxe à tona os fragmentos que considerava separados; estes cacos polidos de emoções, segredos, revelações, disposições, complexos psicológicos autônomos, que emergem(e emergiram) com força, e é com força que eles reclamarão cada um por vez, sua parte no bolo: um verdadeiro banquete. O bruxo não vai poder dançar sobre os cacos, vai ter de se adaptar, entender, e parar de fazer bruxarias levianas, vai ter de crescer, ganhar responsabilidades e parar de se enfeitiçar deste forma. Vai ter de abandonar o misticismo para vender escravos na bolsa de valores, ou então viver como um vira-latas errante, sem um puto para comprar uma latinha de refrigerantes; mas bruxos, bruxos libertários não bebem refrigerantes; não gostam de vender escravos(já que espiritualmente não se pode diferenciar o escravo do senhor).

Bruxos tem capacidade de consumo limitada, muito limitada. Isto não os torna bruxos, é algo mais é claro, mais é um voto de silêncio, um voto de silêncio que faz parte dos rituais.

Bruxarias levianas, disse sua maga preferida, são só para bruxinhos recalcados(era uma noite sensual e ela estava bêbada, como poderia acreditar realmente que com aquela cinta-liga vermelha e depois de sete ou oito garrafas de cerveja ela diria a verdade?).

O bruxo dançou desajeitadamente no último sábado, lançou magias baratas de sedução(contrariando a maga ruiva, a ruiva maga), bebeu cerveja até as oito da manhã, contou estórias de fadas e encantos célticos à beira de um prostíbulo plástico, um prostíbulo a céu aberto, de consumo, de falsa diversão e de ficções sociais regado à cerveja e música cyberpunk: bruxaria new wave, oh sim!

Lançou sigilos, que funcionaram, claro, sempre funcionam. Basta concentração. Era fácil encantar as filhas e filhos do mundo de silício.

Resolveu não abrir baús. Davam trabalho demais. Mexeu a água com a ponta dos dedos, a diferença de temperatura era brutal, que água gelada, que água gelada.

Quando você for me visitar novamente ruiva, não me leve mais a morte para meus sonhos, por que brincar com a morte é algo efetivamente sério, é algo que não pode ser irresponsávelmente manipulado à distância com sua magia barata! Traga me flores e bombons na próxima vez! E nunca mais tente se cortar na minha frente ouviu bem? Não descerei catacumbas tentando lhe esquecer, hoje faço isso sem ter de sair de casa! Você não pode chegar ruidosamente assim deste jeito, peça licença, entre na fila, jogue seus feitiços de maneira mais apropriada! (bruxos também não se entendiam vez ou outra)

Farei um sigilo, um sigilo novo, um sigilo que despertará a rebeldia em níveis mais apropriados(a cafeteira tinha quebrado novamente).

Crowley era uma escoteira de final de semana, agora as coisas vão ficar certas; um Ravachol anarco-pagão não precisa de falsos líderes, pois todo líder é um sintoma de uma energia espiritual aprisionada em receptáculos errados. Bruxos conduzem a liberdade pelas vias erradas, mas do jeito certo!

Tudo pode ser usado como um medalhão. Um pente, um abridor de garrafas ou uma modem ethernet por exemplo; basta usar o focus, basta fluir por entre as ondas/partículas, partículas/ondas e iniciar o feitiço apropriado do não-agir agindo(redundante ou contraditório, mas fácil de ser entendido se não se vive numa sociedade de silício ou se procura entrar em contato com algo subcutâneo e subterrâneo a isto).

Bruxos tem princípios definidos. Druidas consertam estragos. Bruxos o fazem. Estragos necessários. Políticos se previnem de câncer de próstata. Bruxos andam sob tiroteio cerrado. Cardeais da economia tomam prozak, bruxos bebem vinho até o amanhecer. Bispos da burocracia lêem livros de auto-ajuda no final de semana, bruxo fazem amor durante todo o sábado(na verdade é o amor que os faz).

Matar o deus-silício é uma necessidade de todo praticante de bruxaria. Peixe e serpente não podem conviver juntos e todo bruxo sabe disto. A morte dos bruxos e do deus-silício estão íntimamente ligados. A diferença é que enquanto um evita, o outro atrai, um defende o outro ataca, não necessáriamente nesta ordem e os bruxos no final das contas são maravilhosas estrelas dançarinas, cujo ponto final não está encrustado em nichos de mercado estabelecidos em datas de consumo acelerada e muito menos em mortes parceladas em boates coloridas: bruxos só morrem quando a chama da rebeldia se apaga dentro de seus corações.

Bruxo lembrou-se da maga, esta pagã ingovernável, filha da lua avermelhada, dos rituais pagãos temporários em que se podia mover metade do mundo com uma alavanca...

Lembrou-se da época em que o deus-silício não era tão forte, apesar de não ter vivido materialmente, físicamente naquele tempo pretérito. Lembrou da água límpida. Da floresta susurrando... E viu...

E sentiu... E observou... e percebeu que os bruxos libertários estarão sempre destinados a enxergar a vida de uma forma meio mágica, meio diferente, apesar do silício, apesar do maldito e do vingativo deus-silício...

sábado, 15 de dezembro de 2007

De como eu pintei uma porca de barro e criei um totem de guerra

Hoje ruiva, eu consegui rasgar uma foto sua. Não imagine a cena, por que é geralmente mais patético do que você pode imaginar. Além disto, consegui(falhas de memória) encontrar soluções para todas as coisas que diretamente lembram você. Não eu não vou dinamitar ou dinamizar nada, muito menos queimar cartões-postais, fato é que preciso cada vez mais dormir até mais tarde. Estou de férias ruiva; foi difícil, eu sublimei tudo por você, digo, eu sublimei você por tudo, e deu certo. Cumpri todos os meus compromissos políticos e profissionais(como se houvessem compromissos que não são políticos e tomara que existam), me dei extremamente bem em todas as atividades intelectuais que me envolvi e até vejamos, consegui pintar a porca de barro de vermelho e preto. Estou realmente me organizando, coisa que você sempre achou impossível de ocorrer.

Paralelamente a isto, há dois fatos ocorrendo com maior ou menor amplitude ruiva. Na verdade são mais do que dois fatos, mas não conseguirei sistematizar nada(deixo isso para uma monografia estéril de gaveta de universidade) com cerveja preta nos córneos(usei esta palava nesta carta por que sei que ela causa invariávelmente uma sensação suja que remete às pornochanchadas da década de 70).

Minha porca está vestida para a guerra, de preto e vermelho, prepara-se como uma aborígene(eurocentrismo latente) para um confronto. E realmente ruiva, haverá um confronto, quer dizer, já está havendo ruiva, este combate se iniciou há algum tempo.
Primeiro que está chovendo há dois ou três dias consecutivamente(mas esta não é verdadeiramente a questão). Segundo, que há uma tentativa interior realmente fracionária, fracionada, de me monopolizar emocionalmente, e você faz parte de um dos complôs internos. Dominar-me furiosamente, eis a questão.

Acho que não estou tão triste como poderia estar(mais a frente você verá que isto não é verdade). Isto também passa por uma ligação intríseca com o Nato Ruiva, você sabe. Há um equilíbrio esquisito em toda a nossa trajetória, e eu tenho que me manter forte enquanto ele se ferra e vice-versa.

A outra parte realmente importante em toda esta conversa, é que na maioria das vezes a sobriedade atrapalha as convicções e as reflexões, mas é um fato a dizer, digamos que por consenso, que não consigo mais olhar para nenhuma mulher como olhava para você ruiva. E quando vejo uma ruiva em potencial, exponencialmente sou desprezado, por mim mesmo na maioria das vezes.

Para que você não ache que eu estou tornado toda a discussão uma questão boba de gênero, acho que o inverso também é verdadeiro, há muita gente boa querendo se encontrar, mas a vida, é a arte dos desencontros(isto aqui eu roubei do Fernando Sabino ruiva, mas é tão bom que não consegui evitar).

Pois bem ruiva, ruiva lembra rubro, lembra rojo(vermelho), lembra a cor que eu pintei minha porca de cerâmica, vermelho e negra. Vermelho paixão, preto mistério, soma de cores, e de humores. Lembra guerra. Guerra declarada, guerra interna. Uma batalha surda, silenciosa, que ninguém vê ruiva, é verdade, ninguém vê. Como eu disse anteriormente, fingir confiança dá confiança ao mundo, mesmo que o castelo interno de cartas esteja desmoronando é preciso não entupir as pessoas de problemas alheios para resolver(ser você mesmo já é um baita problema - imagine ser outras pessoas por pouco tempo).

Hoje eu pensei novamente em fazer algum tipo de terapia, pintar porcelanas não é suficiente, escrever, agir intelectualmente, tudo isto pode ser tão motivador, mas há uma lacuna não preenchida, que simplesmente não consegue, não consegue(lacunas na memória)...

Eu queria fugir logo ruiva. Voltar logo para o Uruguai. Talvez até a Argentina e quem sabe, Lima, quem sabe...

Pausa para o jazz(algo meio nervoso diga-se de passagem).

Zorrita. Este é o nome da porca ruiva, zorrita. Vingadora. Olho para a vingadora, pintada de vermelho e negra, camuflada entre a escuridão desse meu quarto pequeno, pequeno e espúrio, o que me causa a sensação de que talvez não conseguiria abandoná-lo sem recriar outro ambiente igualmente introspectivo(sem pagar 200 ou 300 paus por isso).

No fundo há um cd de jazz, não é tão glorioso escutar jazz com tanta regularidade mediante dias como este, mas ainda assim é excessivamente, geralmente, reconfortante. Talvez deveria fazer isso daqui a vinte ou trinta anos, mas não posso; para quem não acredita em muitos anos posteriores de vida, há de se fazer tudo o que sempre quis intensamente, o que me gusta ruiva, o que me gusta.

Morrer numa banheira com os pulsos cortados ou sumir pela américa central, tanto faz para uma vida de niilismo. Mas eu não sou um niilista ruiva, eu até brinco de niilista, como toda alma adolescente resolve brincar em finais de semana, mas eu não tenho vocação para isto, você sabe.

O grande dilema é saber o que se gosta. O que realmente é aprazível dentro desse joguete de morde-assopra.

Daqui a pouco ruiva, eu descerei para comprar algumas cervejas no posto de esquina, aquele 24h(já desci, voltei ruiva), em que todos parávamos como se celebrássemos algum solstício de verão(solstícios próximos do meu primeiro cumpleaños pós-ruiva), animados pela fúria juvenil armazenada. E eu me lembro de você ruiva, sorrindo tão liberta, com expressões, tão tão, extremo-orientais? E eu nunca fui tão longe ruiva, apesar de você assumir tantas formas, múltiplas formas, isto significa paixão, ou não significa amor, ou nada ruiva, nada destas linhas podem significar algo necessáriamente, além de catarse, catarse vergonhosa é verdade. Não acredite muito em mim ruiva. Não acredite. (me arrependerei provávelmente)

Eu posso morrer fazendo isso ruiva. Talvez isto seja uma síndrome do pânico prematura ou apenas uma intuição que quebra o efeito causal-linear da história, do tempo, e toda esta coisa jungiana que me invade em momentos de euforia.

Eu achei que esta carta seria boa ruiva, mas esta carta foi a mais medíocre de todas. Eu gostaria de expor esta carta como eu nunca fiz com todas as anteriores, gostaria de expor como um animal sacrificado num ritual aborígene(sem eurocentrismos) de deixá-la como um símbolo, como um totem de um momento particularmente interessante em todos os sentidos, pois sei realmente, e é a única coisa que eu sei, e que sinto, e a partir desta vírgula não estou mais me importando com os altruísmos, com as batalhas que eu assumo, que eu mesmo travei, anti-egocêntristas; voltando ao assunto principal, e é bom pontuar um foda-se neste momento, nesta parte, somente para lembrarmos de onde falamos(um cara arruinado e etceteras são falhas de memória!)

Chega de ruiva, chega da porra toda, chega dessa merda sem sentido. O fato caralho, e o caralho também é um falo, digo um fato, é que merda ruiva, merda, está difícil me sair como uma pessoa normal. Entenda normal, no melhor sentido. Eu digo, desejo, e desejo bastante ruiva, beber meia dúzia de cervejas dentro de um bar vazio, eu desejo, ruiva, dançar despreocupado sem a opressão, e isto vai ficando mais claro para mim ruiva, a opressão de não conseguir filtrar, isto cega demasiadamente.

Ruiva eu preciso de uma boa dose de normalidade. Sem músicas tristes, sem religiões. Não quero me religar a nada ruiva. Não quero me religar a nada. Quero me desligar de um monte de coisa. Dividir pesos. Dividir problemas, conversar, rir de verdade ruiva. Rir de verdade. Eu não quero mais sentir aquele medo ruiva, aquele peso, aquela dificuldade de respirar em lugares muito cheios.

Rir e sofrer sozinho já perdeu a graça.

Eu quero você de volta. Querer é necessitar? Talvez seja ruiva. Talvez stirner esteja certo.

Talvez.

Goethe é mais fatalista é verdade, Stirner e Nietzsche muito mais orgulhosos. Eu? Eu me enquadro no time do meio. Meio orgulhoso, meio fatalista. Mas acho que em todos estes estereótiois, há o vício em questão, o vício, seja objeto, seja sujeito, estamos todos dentro do furacão. Do furacão-deus ruiva.

Resumindo a porra toda, sem eufemismos poéticos ruiva.

Tive vontade de me contar(era me cortar, mas o tal infinito em sua sabedoria transladou apropriadamente), de me matar em parcelas, por que matar-se de uma vez só exige coragem, coragem que eu não tenho, tive vontade de me queimar ruiva(falhas de memória), de encarar um panzer, de explodir um fascista, de voltar no tempo e matar fascistas, de explodir pontes alemãs em meio à resistência francesa, resistência espanhola, e tentar quem sabe, quem sabe, dar sentido a uma vida, mesmo ideológicamente interessante, mas monótona, monótona, pois é a era das depressões, espirituais, e morais.

Chega ruiva... chega... de aniversário(cumpleaños) eu quero lâminas de barbear de presente. Só para lembrar que apesar do pessimismo, da contradição inerente, que me faz agir, mover-me, enfrentar as engrenagens mórbidas do poder, eu nunca vou desistir, mesmo com as ferramentas erradas na mão.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Qual é a questão?

Ceder meu orgulho
Não está em questão

Quem sabe uma dose de chá
Um encontro casual
Numa terça-feira ensolarada

Mas ceder meu orgulho, não
Isto não está em questão

Um passeio no centro da cidade
Um bom copo de cerveja à tarde
Um livro que não li

E você nas minhas memórias
Percorrendo as páginas
Com meu marcador de textos
Com meu marcador de emoções...

Lapidar um poema velho
Pintar a casa no final do ano
Fazer um castelo de cartas
Num sábado de ócio
Cozinhar ao som do silêncio
Enquanto o sol ferve lá fora

Mas perder para você
Simplesmente, não está
Em questão

Caminhar desajeitadamente
No aguardar de situações limites

Situações, objetos, cheiros
E emoções
Todas cúmplices da tua presença invencível

Perseguindo-me no assento
De um ônibus vazio
Na madrugada áspera
De um feriado vazio

Nas entrelinhas de uma conversa
De segunda-feira tão triste
Deus, tão triste

Rosas no meu quarto
Perdidas na austeridade
Do meu amor-próprio austero
Austero e burro

E eu jogado esperando um golpe de sorte
Afastar você longe de mim
Como se fosse possível...

Pois perder para você, não!
Isto não está em questão...

E qual é a questão afinal?
Você me pergunta
Ansiosa e linda
No meio da sala

A questão é que eu te amo, sua boba

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Cabelos Rosas passeando na rua

Desceu do carro meio desajeitado, desceu com calma, apesar dos conselhos do taxista de que iria chover(e taxistas são excelentes meteorologistas) não se preocupou com possíveis chuvas repentinas.

A chave do apartamento estava no bolso esquerdo, mas ele não sabia; isto o fez revirar a mochila por duas vezes. Objetos parecem ganhar vida em determinados momentos. As nuvens estavam com matizes que variavam do preto ao cinza claro, havia um pouco de pressão sob a cabeça das pessoas que fugiam rápidamente, antecedendo o clima ruim.

Apesar da acidez das chuvas das grandes cidades ele não ligava para a chuva. Molhar-se naquela ocasião seria uma moldura perfeita para um quadro incompleto, que ele tinha pintado há exatos 13 meses. Desceu a rua, a loja árabe ainda estava aberta, o que indicava que ainda era cedo.

Cedo para o que, ele não sabia.

A menina de cabelos de pontas rosas passeava por entre a quarta esquina do boulervad de terceiro mundo do bairro decadente em que se metera. Próximo ao curso de inglês. Pessoas interessantes estão a léguas de distância de quaisquer aproximações. É quase uma lei da física; sem o Newton é claro.

Ela era bonita. Mas as pontadas no estômago não.

Estas o perseguiam; (estômago é um órgão e uma metáfora barata de escritores medíocres) era uma dor, uma agulhada rápida, um ímpeto fugaz que lembrava os sonhos da noite passada, que lembrava algum problema mal resolvido, uma configuração aberta, uma forma destoante.

Algo estava desajustadamente aprisionado numa caixinha em formato de coração.

Pronunciar desejo em espanhol é muito mais chique. Dezerrrro.

O Desejo batia no teto, um teto baixo, bem limitado, contorcendo-se. Era um mecanismo de defesa muito eficaz; punir o corpo/mente, jogar descargas de adrenalina, tudo fazia parte do plano secreto do tal destino.

Não era tão confortável e ele não sabia própriamente se teria de romper com aquilo à força. Era muito mais seguro permanecer naquele jogo limitado de impressões sociais vazias de sentido, fingir estar feliz para encher todos ao seu redor de confiança e satisfação, fingir estar triste para produzir respostas para si mesmo, fingir estar confiante para distribuir confiança ao mundo; deus! Que manipulador!

Passavam na rua; mãos dadas.

Joyce amava João, que não amava ninguém.

Joguinho engraçado.

E andam como um casal de apaixonados... A paixão é tudo, menos um roteiro de novela das oito, assim não funciona.

No outono as coisas vão melhorar. Além da falta de calor excessivo, esta estação propicia um contato maior com uma parte de si negada. Queimaduras de cigarro estão proibidas em 2008. Em 2020 e 2056 também.

Voltando ao bairro, a ruiva, digo, a de cabelos com pontas rosas, as eventuais obsessões, ao curso frustrado de espanhol(te quiero!), a viagem que ainda fará ao uruguai, ao neo-paganismo, ao ocaso, a sabotagem do inconsciente, enfim, toda esta luta inerte e aparentemente ineficaz contra uma depressão que como uma caixa d'água aguardando uma gota, como uma rachadura esperando um abalo sísmico, como uma bomba relógio aguardando um segundo, se esparrama e se intensifica mediante velhas novas impressões, sem que para isto necessáriamente conseguisse trazer de volta aqueles velhos rituais punitivos patéticos de gente mórbida que pensa dar sentido a vida no eu me odeio e quero morrer. Por favor. Cianureto não necessita de guardanapos.

Há problemas. Há grandes problemas. Grandes demais para ele sentir-se no direito de dobrar a esquina e encontrar a falsa ruiva de pontas de cabelos rosas. Falsa demais.

Estes mesmos grandes problemas, o impelem a desencontrar-se em plena crise de pânico, de correlação de forças, de muita coisa muito junta, muito separada.

Achou a chave, achou a fechadura. E não choveu no caminho. No terceiro degrau, no degrau três, aquele sujo de tinta guache, das crianças que brincam no prédio, ele subiu e a chuva caiu. Sem tinta, sem chuva, sem criatividade, ele só desejava um cantinho geográfico essencialmente/isoladamente feliz. Talvez seus desejos tornem-se realidade. É uma pena que estes tenham sua própria dinâmica. E que esta dinâmica diga novamente todos os dias: lute contra quem lhe aprisiona em caixinhas ao invés de fingir piedade.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Depois de um testemunho surgiu-me a inspiração

Eu sou um bruxo. É verdade. Um bruxo. Chamem o bruxo, me de bruxo - falaram uma vez. Não há motivos em me chamar quando não posso voar. Voarei por cima dos sonhos alheios. Voarei por cima da ruiva, do ruivo, do francês, do não francês. Pegarei o metrô em paris. Mas isto é um sonho. Paris, e a Torre Eiffel e um idiota de camisa verde colocando moedas num telescópio fazem parte de um sonho. É bruxaria. Queimem os bruxos! É bruxaria.

Fazer planos(correr, fugir).

síndrome do pânico [muita gente].

Momentos em euforia[pouca gente].

Além
disso.

Há carência. Carentes, em filas, exterminados sistemáticamente de forma industrial. Na verdade. Os exterminados são os exterminadores, licença poética a parte. À parte. Por que aos fascistas nem água! Nem água! Exterminadores são exterminados. Exterminam-se. Matam parte de si. Matam-se inteiros. Matam a parte humana da humanidade; e isto dolorosamente não é redundante. Hiroshima e alguns dias depois, e serão nestes dias que teremos esta prova, provarão, redundarão neologismos, e teorias em pseuo-poemas.

Con
Cre
Ta
Men
TE

Mente! Mente!

Mente poema! Tu mente! Usted! Mentes!

Menta. Menta planta-se. Ouviu? Planta-se.

Planta-se como sonhos, sementes oníricas, que percorrem cervejas sem álcool. Faltam poucos dias para acabar o tal ano velho.

Faltam poucos dias, poucas horas que parecem eternidades.

Esta terça não importa. estarei num lugar espiritual.

Pois é tudo meio de esquerda, meio farsante.

sábado, 8 de dezembro de 2007

Jurado de Morte

Sereno, ele sabia que não podia vacilar. Esquecer aquela mochila foi a coisa mais estúpida que ela já tinha feito em todos os anos que trabalhou para a "firma". Trabalhar como mula não é algo fácil, os riscos são altos demais, mas a grana compensa, além disso, se você souber disfarçar sua capacidade de consumo, conseguirá ir bem longe na profissão.

Ele nunca tinha sido pego, uma vez encarou uma blitz, mas com documentos certos e uma frieza ímpar tudo ficara resolvido. Por isso era um dos melhores. E melhores não erram.

Mas ele errou. Alguém, algum filho da p#$@, conseguiu pegar a mercadoria antes de mim, se eu não encontrá-la antes das 18h ficarei jurado de morte. Se não encontrá-la até as 22h, é bom providenciar uma passagem pra bem longe, talvez pro Uruguai, ou pra Costa Rica. Nesta vida, ninguém esquece. Eles não vão esquecer. Ninguém confia em ninguém nesse meio. A palavra só vale quando o compromisso é cumprido. No seu caso, o compromisso poderia estar no fundo do rio ou nas mãos de algum amador ambicioso.

Voltaria para a rodoviária, foi lá que tudo começou. Contaria seus passos. Imaginaria todo o processo. Talvez alguém tivesse pego o pacote por engano.

Resolveu ligar para Pablo, não estava, deixou recado, pegou um táxi. Entrou em casa correndo. A casa estava toda revirada. Merda.

Sai dái seu imbecil. Foge.

Saiu apressado, esbarrou com o porteiro. Sai da minha frente!!!

Corre cara, corre. Correu. Pegou o primeiro ônibus, as pessoas estranharam seu comportamento.

Resolveu descer perto do shopping, procuraria Pablo, Pablo tem a resposta.

Ligou para o celular dessa vez.

- Pablo? Pablo.

Esta não era sua voz.

- Dieguito, mataremos toda a p#$%@ da tua família e desse teu amigo filho da p$#@ se você não nos entregar a merda da mercadoria! Compreendeu cábron?

Mesmo se quisesse dizer algo, mesmo se tivesse tempo, mesmo se tivesse pensado em algo, não daria, de qualquer forma, não daria. O telefone desligou. Resolveu pegar um táxi.

Encontraria Pablo na casa de Rose. Era o melhor lugar para se esconder.

Em cinco minutos estava lá. Bateu, Rose não atendeu, parecia não ter ninguém em casa. Deu a volta nos fundos e encontrou Pablo com uma pistola alemã em uma das mãos. O que houve?

O que houve cara$#@!! Os filhos da mãe chegaram mais cedo.

Mercedita está morta. Juan também, vou para o Brasil amanhã, não há mais como ficar aqui. Te aconselho a fazer o mesmo. O apartamento foi revirado.

Eu sei, eu vi merda!

Se tu quiser pode pegar umas roupas minhas que estão na Rose, parte amanhã comigo, eu te dou uma carona.

Pablo, não estou entendendo! O que houve afinal, por que os caras partiram pra cima de nós desse jeito!

Não sei também, mas vou descobrir. Talvez o González tenha falado merda. Me segue.

Foi na frente, entrou no quarto que Pablo indicara, deparou-se com o espelho, e a imagem deu lugar a um misto de frustração, arrependimento e indignação.

Pablo, pablito, su pablito, apontando a arma para seus pulmões...

Morreu com três tiros... um na nuca...

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Histórias do condomínio

Plaft. Jazia a melancia no playground, estatelada mórbidamente pelo desastrado Alberto.

Quinto andar. Poderia ter matado alguém lá embaixo.

O murmúrio aumentou, a história se alastrou e o síndico por fim ouviu.

Abriu-se então uma sindicância, sindicância condominial da melancia.

Todos gostaram do nome.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Deixa-me, Deixa-nos

Vai, deixa eu jogar tudo pra fora
Vomitar minhas letras pútridas
Em cima do conforto cínico dos contentes
Caminhar por entre os trilhos firmes
De velhos expoentes

Deixa eu cair por entre as fendas da vida, escorregar
Fazer sorrir e chorar, sem me aproveitar do torpe presente

Deixa eu me aquietecer escondido por aí
Deixa eu me livrar da tua rotina insensível rotina
Deixa eu me entristecer no fio da palavra
Esconder-me no não me cala!
No não me puna!
No não me falha
Dessa gente que não cansa!


Deixa eu soltar palavrões
Eufemizados por vãs expressões
Até que me partam os princípios
Nos instantes insípidos...

Deixa eu partir como sem memória
Traído por um momento de glória
Enrijecido por tristes histórias
De um alguém que já não sabe mais
Onde plantar suas tristes vitórias

Deixe-me acreditar na utopia
Palavra forte que me guia
Que me aquece, que me afia

Deixa eu me largar por entre os becos
Da vida parida; parida entre os dentes
De um sorriso amarelo

Deixa-me sonhar com o que não vem
Deixa-me flutuar com quem nada têm

Para trilhar sonhos puros, coletivos
Derrubar os falsos muros

E guiar a estrela vívida
De uma nova sociedade

Rumo ao encantamento
Rumo ao destino
Rumo à inexorável esperança
De alguéns que sonham juntos
Com a liberdade

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Das pequenas vinganças


Está chovendo, eu encontro a garota oriental na esquina, e ela me leva até a casa dela, aquele bairro vazio, que exala cheiro de chuva dos paralelepípedos e repleto de casas pequenas, de casas antigas. As velhas vilas operárias, com seus portões curtos, atarracados, com sobras de ladrilhos decorando calçadas. O silêncio é total, e só se quebra com os respingos batendo nas telhas de amianto da rua.

O bairro é um bairro fantasma, eu entro na casa e percebo a cilada. Será que a garota armou pra mim?

Do quintal eu vejo um pqueno grupo do outro lado do rio, um rio não, um valão fundo, imprensado por grandes paredes de concreto e com a água lamacenta da chuva alterando seu cheiro e sua cor.

Sob uma árvore eles já me esperavam.

Pode ter sido coincidência, talvez ela não tenha armado uma pra mim. De qualquer forma agora já era. Eu reconheço o líder do grupo, é um sujeito desprezível, não é o mais forte dentre eles, mas definitivamente é o que sabe bater melhor. Tem um sujeito grande que também me amedronta, mas esses tipos idiotas caem no primeiro minuto de briga.

Eu não fujo, ela percebe a tensão e eu procuro uma arma branca para me defender, nos fundos da casa. A garota sabe que não há volta, ela iniciou o bailé, agora terá de assistir o espetáculo até o fim. O grandão como esperado, é o primeiro a se atrever ao embate, azar o dele, meu pedaço de cano de 30mm já está o aguardando com fome de justiça. Ele parte meio desajeitado, eu me lembro do Tao do Jet Kun Do, seja duro com o suave e suave com o duro, a mesa vira um obstáculo para o brutamontes, ele demora muito a pensar e eu o derrubo com uma sequência curta que não me faz nem começar a soar. Ele cai no valão, é o seu destino. Eles passam um por vez, o segundo não tem as mesmas chances, me acerta sem vontade e depois de uma joelhada nada elegante, resolve ir se esgueirar em direção ao canto do tanque de cimento da casa. O soco na face esquerda é quase como uma sequência de frustrações acumuladas que eu irrompo com energia.

O atrevido chega mais rápido do que pensei, este sabe bater. E durante vinte ou trinta segundos, o enfrentamento é equilibrado. A garota se afasta, e eu sei que a hora de acabar com aquilo é agora. Um chute que me dói algumas costelas mal dado; pois bem, é o preço da vitória, é o aceno dele sonhar com os peixes, boa viagem, mão esquerda firme, mão direita como alavanca, perna esquerda calçada e um apenas leve inclinar de forças corporais, o leva aonde eu queria: vai pro fundo do rio seu animal. Não há tempo pra saborear a vitória, isto não é um filme oriental. A única oriental já se encontra fora da casa e eu tenho de alcançá-la. Ela está com um guarda chuva.

Eu não sabia de nada ela diz. Fingirei que acredito, apesar de ver sinceridade na cor de seus olhos. Eu me despeço, e digo pra ela esperar em outro lugar. Os idiotas vão voltar.

Ela diz que nunca gostou mesmo daquela vila. Conservadora demais.

Eu falo que tenho que passar no apartamento. Tem gente me esperando lá.

A garota acena com a mão esquerda enquanto a chuva desce pelo bueiro semi-entupido. Não há muita troca de expressões, não há muito o que dizer, apenas que minhas costelas dóem e eu tenho de chegar ao apartamento para recuperar minha bolsa.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Das vezes em que se meteu com cerveja preta

- Anatole...

- Diga, Vasilli.

- Deixarei meu cabelo crescer...

- E o que tem isso de importância? O que tem, isto de importância perante esta lua. Esta lua linda.

- Nada porra. Reflete apenas falta de compromisso Nato.

- Com o quê Vasilli?

- Com a vida Anatole. Com a porra da vida!

(chega de travessões)

Olha pra praia soltou o russo. Olha pro céu, pro horizonte, e pra lua. Ah! Pra lua você já olhou. Seu cínico! Olhaste pra lua antes de me convencer de alguma coisa. Golpe baixo Nato.

Golpe muito baixo,(expulsou Vasilli) antes de tragar a longneck, ou grande-nariz perante uma tradução chula que insistia em manter; na verdade nunca tinha pensado no longo nariz... longo nariz....

Nato, em algum lugar do inferno há Eric Clapton e Velvet Underground tocando...

Tem o Buckley Vasilli. Deixa de ser anti-intelectual. Tem a porra do Buckley. Tem o Ian Curtis, tem o pop do Cobain tentando convencer a quadrilha de seatle a escutar o Thom Yorke... Tem tudo Vasili. É a igreja do diabo. Escutaremos os anos 90 como se fosse woodstock Vasilli, seremos os mártires do fodase, seremos os provos, a bicicleta branca, a contra-cultura renovada.

Deixaremos de ser os irmão do meio.

É verdade Nato, resmungou Vasilli antes de virar meia long-neck, meio nariz, longo nariz, completo nariz de cerveja; sujo de espuma.

E cerveja preta, pensou Vasilli, cadê a porra da cerveja preta??

Está caída, pensou Nato, pensou também Anatole. Mas não se comunicaram. Não conscientemente. Mas estava lá. O diálogo existia inconscientemente, mas nunca saberiam. A ciência nunca saberia.

Subjetivismos não fazem parte do ocidente, nem da ciência, nem de vagões de metrô ou jogos de futebol.

- Nato, ontem tive sonhos realmente impressionantes.

- Entrava num bunker. Escadas. Lembro-me do cartão. Das pessoas correndo. Lembro-me da bicicleta no pântano, de combates pseudo-medievais, lembro me do céu nato, do céu, virando noite muito rápido(as expressões corporais de Vasilli segundo Anatole pareciam muito, muito infantis), me lembro de me esconder atrás de muros de pedras, muros de pedras frágeis, frágeis como minhas repetições, frágeis como o meu eu Vasilli(e bateu no peito como king kong, o que tornou a cena mais patética do que já era).

- E como você se sentiu(Vasilli aprendera pseudo-psicologia no Discovery Channel)?

- Bem gringo. Até escutei aquela bossinha que você me passou.

- Tá. Tá Vasilli(Anatole começara a ficar realmente bêbado).

- Nato...

- Diga Vasilli vazio....

- Deixarei meu cabelo crescer.

- Fútil... Futilidade (em tom de desdenho).

- Em tom de desdenho Vasilli. Deshhhdenho...

- Tá bem. Chama a ruiva, grita ela, que eu não tô em condições. Grita ela Nato, grita ela que nós vamos juntos pra casa.

Acabara o álcool de Anatole. Precisava resgatar Vasilli. Precisava. Ele está no fundo.... Não há mais chance. Ele chegou ao fundo. É hora de resgatá-lo. Há imagens demasiadas.

O russo enlouqueceu, particularmente.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Fingir Estabilidade

Estava aqui jogado, enquanto ela me buscou. Tudo a lembrava. E o fato de eu não usar "maldita" após o último verbo já indicava uma esperança, uma esperança crônica que me consumia, que me consumia com os cabelos amarelos cheios de tinta. E eu prometi, prometi a mim mesmo que deixaria meus cabelos crescerem junto com meu orgulho e minha resistência ao fracasso, somente para observar o retorno de algo que já tinha terminado no verão do ano passado.

Com cabelos amarelos ou não, com não-ditos, ou com misericórdias embaladas para finais de semana, eu me esforçaria para não tornar tudo mais patético do que já era.

Desperdicei. Matei metade da minha vida procurando e esperando. Foram vinte nove anos esperando você ruiva. Foram vinte e nove anos, esperando algo, ou alguém, que não conseguisse terminar com metade do meu tédio, metade do meu tédio repetido ruiva, como seus cabelos vermelhos repetidos, sorrindo, como você sorrindo, e bailando bêbada, perdida, um tanto quanto suicida, um tanto quanto irresponsável, enquanto eu me dirigia, me dirigia por palavras repetidas, e preciso repetir quantas vezes for necessário para que você entenda, para que você entenda, que há um pedaço de caos, de liberdade ruiva. De cabelos vermelhos dentro de mim.

Do caos, da espuma, e do pó, surgiram atores, surgiram alter-egos, surgiram frases. Surgiram pedaços de coisas, de emoções esquartejadas, de falsos riscos, enquanto eu via você bailar.

No censo da perfeição, você ocupa o primeiro lugar, o primeiro lugar, antes que eu conseguisse olhar em seus olhos, olhos amendoados que exalavam desculpas. Enquanto isso, naquele dia, perto do aquário artificial, perto do aquário à luz do dia eu fingia estabilidade. Eu fingia certezas. Quando na verdade, exalava dúvida. Quando no entanto, exportava insegurança.

Não haverá fim. Por que exatamente, não há fim em crônicas ruins.

Em crônicas ruins, só se pode exigir sinceridade, dor, e algo parcelado emocionalmente entre tudo isto.

Entre tudo isto. Repeti, repetimos, enquanto eu sonhava com bicicletas. Bicicletas repetitivas ruiva. Repetitivas.


sábado, 1 de dezembro de 2007

Crise de Produtividade / Desafio de Dezembro / Mêcanica da introspecção

A idéia surgiu há exatos 30 segundos. Tentarei escrever 21 contos/crônicas/micro-contos no mês de dezembro.

Crise de produtividade.

Até a data do meu aniversário, serão 21 contos(valem micro-contos) escritos. Contando a partir do dia 1º de Dezembro. Inauguro com o Poliedro Infinito que os srs. podem saborear logo abaixo.

Talvez eu me arrependa, e apague este arremedo de promessa.

Poliedro Infinito

-Como está?

-Bem. Tirando alguns anos de idade, um pouco de cafeína no estômago e uma ligeira melancolia pré-dominical, é claro.

- Quanto custou?

- 60 pilas, sem troco para a cerveja.

- Pode ficar. A única coisa que eu guardo são as mágoas.

Despediu-se.

Estava muito ruim.

Frase excessivamente clichê. Vanessa não gostou. Amassou outra folha. Aquele diálogo era uma verdadeira porcaria. Quando enfim conseguiria escrever algo realmente interessante? Pensou em passear pelo bairro, mas já eram duas da madrugada. Seus cabelos longos, encaracolados, negros como o pulmão de Jonas. Seu vizinho nicotinomaníaco. Talvez colocar aquele velho cd de jazz meio arranhado, meio funcionado. Talvez. Talvez...

- Não. Se isso é o máximo que "usted puede escribir... no tengo la idea de cuál és su mejor!", gritou o espanhol, espanhol não, sou basco filha da puta, eu sou basco, hablo espanhol e portunhol para vocês me entenderem, pensou, e se é o máximo... Eu não quero.

Socou a mesa.

Rodolfo saiu decepcionado. Foram três meses descrevendo Vanessa. Sua compulsão por anfetaminas, sua cafeteira quebrada, seu pedaço de arremedo em forma de poesia. Mas não era suficientemente bom. Não tinha a assinatura dos gigantes, dos gênios, dos que comem e bebem o sangue de amadores no final de semana.

Amadores, enfileirados, enfileirados como Rodolfo. Canetas secas nas mãos, canetas falhando. Mas canetas não falham, elas quebram, dão defeito. "Falhar" é um eufemismo, uma verdadeira proteção para um instrumento supostamente sagrado. Canetas são perfeitas. Funcionam muito bem. Aparentemente de uma proporção até maior do que propulsores de foguetes. Mas na verdade nós sabemos, que as canetas falham como qualquer um, como qualquer escritor, como qualquer objeto mórbido, elas falham. Falam. São tecnologias. E tecnologias morrem, nascem, morrem. Isto daria um bom texto. Desenvolverei o carcamano, trabalharei os alemães, o mito das nacões, o espanhol que na verdade é basco e Rodolfo o escritor que na verdade é poeta.

Rodolfo não sabe, mas morrerá atropelado no penúltimo capítulo. Talvez por um ônibus. Ou por uma bicicleta, é mais irônico, sim, sorriu, é mais irônico.

Encheu o copo de cerveja, apagou as luzes do quarto e acendeu a luminária de centro. A porca de barro estava lá o olhando. Usava uma bermuda verde ridícula, nada nada pós, pús-moderno. Nem estética existencialista tem. Escritor de merda. Rodolfo é minha cria. Um mero marionete. Pule Rodolfo! Pule seu maldito! Morra atropelado por uma bicicleta agora! Agora não! Somente no próximo capítulo! No próximo capítulo!


Em algum lugar, fora e dentro dos capítulos, mais exatamente num poliedro, espreitava Alcindo. Sim, seu nome era um tanto ridículo. Mas Alcindo era bom com as letras. Seu personagem era anônimo. sem estética existencialista, meio esquizofrênico, e de uns tempos para cá isolacionista. Sim, isolacionista. Este texto tinha ficado bom. Alcindo gostou. Gostou da forma com que encaixou as luzes do quarto, a porca de barro.

Estava tudo lá.

Alcindo...

Quem escolhe um nome ridículo deste? Meio parágrafo. Não lerei a tempo. Não entregarei, suspirou Carlos. Alcindo a esta hora estava sendo lido dentro de uma condução, a caminho da biblioteca municipal. Papel reciclado. Texto de seis ou sete páginas.

Multas de bibliotecas são formas explícitas de punição intelectual?

Alguém deve ter jogado isso fora. Está no mundo das idéias platonianas. Era o velho Morel. Sim, o velho Morel. Sua perspicaz barba cinza, o fazia escrever sete ou doze palavras e ser aclamado num velho jornal de poesia. "Meio parágrafo. Não entrego a tempo. Não entregarei, suspirou Carlos. " Cunhou com cuidado. Num dia de chuva, comendo amendoins chineses.

Saíra no número dezessete, rendera duas dúzias de comentários elogiosos. Era um novo record. Morel espreguiçava-se às 8h da manhã, mamão papaya na mesa, cigarro e o jornal de centro-esquerda local. Foi um bom artigo, um bom artigo, pensou Morel, este jornal sempre me surpreende. Morel não tinha filhos, a propósito.

Poliédricamente, no final da corda, alguém resolveu se manter anônimo. O espelho dentro do espelho, foi chamado de poliedro. O ruim era descobrir-se dentro de um conto. Toda vez que alguém o lia, achava-se, meio perdido, meio encontrado. Não sabiam quem exatamente acusar, ou elogiar. O ruim, era ver que eram pontos sem nós ou melhor dizendo, com múltiplos nós. O ponto final sempre se perdia dentro da multiplicidade espelhada do próprio e abandonado conto, que afinal não tinha mais dono, tinha sim multiplicidades fracticidas. Identidades fluidas, perdidas. Tinha rostos infinitos, infinitos, que não sabiam bem aonde terminava a criatura e começava o criador.

Pois ninguém sabia decerto, quem era o autor daquele maldito poliedro infinito.

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Charles o pós-moderno

Ia ser um conto, mas por minha preguiça e inabilidade, transmutou-se em uma poesia; sinceramente pensei umas nove vezes antes de publicá-la. Agradeço a inspiração do último comentário do meu homônimo. Tentarei fazer um conto. Prometo. A poesia é meio parodiada, é claro.

Acabou a cerveja.

Acabou a criatividade.

Acabou a música.

E agora Charles?

A história acabou.

O muro caiu.

A poesia morreu.

O partido foi pro buraco.

O moderno te corrompeu.

Os futuristas estão no parque brincando.

E agora Charles, digo José.

O pós-modernismo ganhou.

Até a poesia, na labuta, nãO fez se ouvir

Com O maiúsculo.

José, digo Charles!

Vai ver televisão!

domingo, 25 de novembro de 2007

Como se fosse possível articular algo além da solidão


Eu fiquei no meio do caminho. Tri-partido num pedaço de rua, ainda não esquartejado emocionalmente, mas sinceramente esperando algo de relevante acontecer. Olhando velhas ausências acenarem, rodopiando em meio à lugares outrora mágicos, deliciosamente envolvido pelo ritmo da música. Enquanto as pessoas iam, voltavam e iam novamente, eu percebi que a solidão pode ser o real caminho, o caminho real, real no sentido de monarquia, "o estado sou eu", "a solidão sou eu" (palmas para os risos em auditórios, pessoas se levantam em tom absolutista com sorrisos artificiais em volta a cenários de isopor e neon dos anos 80, há algum tipo de música decadente dinamizando todo o ambiente).

Construí os mesmos desafios e repeti as mesmas indagações intencionando criar um drama pessoal. O que fazer com um mundo vazio além de colorí-lo ou transformá-lo em algo surpreendente? (o apresentador sorri e roda os cartões entre os dedos, talvez tenha gordura nas mãos... ou seja esperma seco)

Apesar disso a obviedade está em todos os lugares.

Não há mais surpresa no óbvio. Por que do óbvio nada se espera. Do óbvio só se tiram velhas lições. E de velhas lições, o mundo já está cheio. Surpreendentemente cheio. Como as velhas lições podem oferecer(cherrleaders fictícias, feitas de isopor dançam ao som de músicas copiadas de um filme pornô dos anos 80).

E foi pensando nisto, que resolvi me afastar do óbvio, de ignorar a obviedade alheia e de ficar vagando no centro da cidade. Por que vaguear, vadiar, ou flanear utilizando um velho conceito do célebre João do Rio, é uma necessidade dos desesperados; desespero dissimulado, até por que quem vaguearia com um belo par de olhos ao lado? Vaguea-se, flanea-se a procura de um ponto fixo, de uma barra que como diz algum cientista cartesiano, "moverá o mundo"(o apresentador é enforcado numa figueira de três metros e sessenta e sete centímetros - as pessoas rodam em volta sem saber que não há uma única verdade).


E andei. E andei. Andei sem pontos de finais ou interrogações. Andei pensando em explodir meu diafragma de cansaço. Mas cansaços, e canções não enchem diafragmas, nada enche diafragmas além de um pouco de esperança emoldurada em serrotes emocionais. Serrotes emocionais eu disse.

Há uma parte espalhada de mim temperando você nos finais de semana. Há uma opinião vice-versa. Há um verso estruturado sobre falsos versos, sobre certos caminhos. Há caminhos.

Cerveja no chão do quarto, ao lado de deus e das caixinhas, das latinhas, da falsas, das farsas espinhas, das perdidas acracias.

Explodir, andar, caminhar, pesar, chorar. Cá estou eu!

Perdido! Com pianos vendidos! Com sangue nos dentes, com emoções crescendo sobre os cabelos!

Há neon, apresentadores dos anos 80. Há algumas farsas. Há falsas criatividades. Há um cheiro de morte, rondando a carência, toda a carência, no ar.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

10 dicas para o pseudo-escritor

1 -Torne uma rotina

Mesmo que não tenha nada própriamente para ser escrito. Aguçará sua criatividade. Isto no mínimo lhe deixará apto a utilizá-la em quaisquer momentos, de alta ou baixa criatividade.

2 - Não desperdice boas idéias

Elas vem e vão, mas podem se perder caso você não anote, não repita para si mesmo, ou não aproveite este delírio dionisíaco ESCREVENDO. Não deixe para depois, mesmo que isso lhe faça escrever em guardanapos, panfletos, jornais, etc. Você pode ficar com fama de esquizofrênico, mas lembre-se, situações deste tipo são fartos materiais literários! Quanto a esse papo de "depois eu lembro" simplesmente não vai funcionar.

3 - Tente variar

Haikai's, poesias, contos, crônicas, letras de música, pintura a óleo, etc. Descobrirá que pode ser muito bom em determinada categoria e extremamente medíocre em outras.

4 - Leia, leia muito

De preferência os clássicos, mas contemporâneos com talento também são bem vindos. Leia os anônimos, leia o que seus amigos escrevem, conhecidos, lhe dará mais idéias, lhe mostrará sua distinção, sua paridade, etc. E também lhe ajudarão a não excrever açin.

5 - Utilize o instrumental que tiver

Papel, máquina de escrever, computador ou o que quer que seja, use! Utilize o equipamento da maneira que lhe aprouver. Há pessoas que funcionam muito bem com o computador, mas simplesmente travam com uma caneta na mão. O inverso também pode ser verdadeiro.

6 - Conheça seus mecanismos indutores

Você precisa saber em quais momentos consegue escrever melhor e em quais geralmente não dá certo. Drogas que afetam a percepção podem ser bem vindas, desde que isto, a longo prazo não condicione seu poder de escrita à este tipo de percepção alterada(ou acabe com seu fígado em troca de um livro que meia dúzia de pessoas irá realmente se interessar). Qualquer coisa que altere sua percepção(como um dia extremamente ruim ou o contrário) pode ser uma boa forma de mecanismo indutor da escrita.

7 - Não racionalize o que escreve

Escreva catárticamente. Isto inclui não ligar para erros gramaticais e para jogadas de estilo. Você pode corrigir tudo depois de terminar; ás vezes é importante apenas seguir a onda, se esperar muito você pode simplesmente "travar". Não racionalize sua escrita. Deslizar inclui, escrever sem medo. E escrever sem medo passa por não escrever para construir uma bela vitrine, mas para colocar esses seus fantasmas para fora.

8 - Não fique num tablado, muito menos numa caverna

A arrogância e os elogios matam um pseudo-escritor. Ou ele se envolve tanto com os elogios, que tenta "repetir" o que agradou, ou se acha tão medíocre a ponto de desmerecer tudo o que escreveu(a falta de confiança e de auto-estima mata quaisquer futuros brilhantes). O primeiro caso é apenas o segundo sem máscaras, mas brincadeiras a parte, os elogios podem matar um bom escritor, que tentará sem sucesso repetir fórmulas de sucesso, que invariávelmente o levarão a bancarrota criativa. Se quer prejudicar alguém, elogie-a demasiadamente. Se quer terminar com quaisquer estímulos, o leve a um sarau organizado por estudantes de Letras.

9 - Envolva-se com material literário vivo

Isto inclui situações das mais variadas. A literatura pobre é aquela que se origina de um escritor com uma vida medíocre, isto inclui pessoas que só conseguem escrever livros de auto-ajuda ou best-sellers de administração de empresas. Um escritor mediano, é alguém que tem mais do que contar sobre sua própria vida do que própriamente a escrever. A experiência do escritor é o seu melhor material literário. A diferença entre escritores e os egocêntricos, é que os segundos escrevem auto-biografias, os primeiros, "disfarçam" e chamam de literatura.

10 - Esqueça os manuais

Alguém que precisa ler manuais para escrever, definitivamente ficará ad infinitun na condição de pseudo-escritor. Mas e quem liga, não é mesmo? Consumimos muita arte por que produzimos pouca arte. E isto também inclui a literatura.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Layout novo

Mudança de cores. Na vida real não é tão fácil.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Da Tristeza de Vasilli

Anatole certa vez, injuriado com Vasilli, resolveu lhe interpelar numa quarta-feira de madrugada, que própriamente já era uma quinta, sobre algumas questões de cunho existencial.

- Vá aproveitar a vida, que ela não te persegue ainda que fosse a contento!

- Estranho-te. Abandona este ar parnasiano e fala como um pós-moderno imprestável que sempre foi.

Anatole gargalhou, era uma boa entrada antes do assunto principal. Resolveu animar Vasilli com mais uma de suas interpelações. Tirou o chapéu panamenho que estava utilizando, subiu em um dos sofás de Vasilli, numa interpretação um tanto quanto pitoresca e disse: - Vasilli, você simplesmente está definhando, enquanto ela está livre meu amigo. Livre como um pássaro. Livre como Quetzal. Larga os cabelos vermelhos, os cabelos cor de ferrugem e vem pra realidade meu amigo! Vem pra realidade que a realidade é tua melhor companheira!

Vasilli, ajeitava alguns livros, colocava-os em uma pilha, no canto da sala como um autômato. Parecia que os seus gestos, seu corpo, traduziam uma agressão à felicidade inconveniente de Anatole.

- Não há verdade mais odiosa do que conceitos absolutos sobre a liberdade meu caro. Enquanto o outro extremo também é verdadeiro, eu devo assumir que por diversos meses eu assumi uma postura complacente com tudo isto. É como se o mundo girasse e fizesse as pessoas ao meu redor rodopiarem, enquanto eu continuei neste balé profano. Faz sentido para você? Preciso ser mais claro, meu bom "Bon Vivant". Vasilli, ressaltou o bon vivant com um ar de ironia que Anatole já conhecia desde sempre.

Adotando um tom mais sério, Anatole resolve contra-atacar:

- Vasilli, não se trata disso. Trata-se de felicidade. Você pode ser feliz com o que quiser, desde que consiga enterrar tudo isto de uma vez por todas.

- Cada um tem seu próprio combustível. Mas sabia que esta luz que você exala como indispensável pode lá ter suas matizes e eu bem escolho o que é felicidade para mim meu amigo. E sua felicidade me parece mais agradável para um apresentador de paródias televisivas. Gente que faz comercial de sabão em pó. Essa felicidade artificial, fingida, forçada que pede clemência e resposta a cada esquina, que sobrevive por repetição. Gente feliz por obrigação. Se é esta merda de felicidade que você me empurra, pode dar a volta, fechar a porta e me mandar cartões com frases cristãs no natal. Será mais honesto. Além disso, luz demais cega. Estar inadaptável não é negativo desde que se encontre seu próprio eixo. E se meu eixo é meio nebuloso, vai lá, por fim cheguei a alguma conclusão.

- Teimoso, como sempre. Além disto continua a racionalizar teus sentimentos com essa teoria de beira de esquina, completou Anatole, antes de acender o cigarro e guardar o isqueiro no casaco de couro sintético, professando oracularmente as últimas palavras inteligíveis para Vasilli.

Anatole, foi a cozinha, buscou uma caixa de papelão que parecia estar ligeiramente pesada; com os pés, livrou-se do banco de madeira que atravancava sua passagem e largou a caixa em cima da mesinha de centro.

- Toma Anatole. Guarda na sua casa então. Guarda toda essa merda na sua casa.

Não fora preciso olhar para dentro da caixa para concluir que eram coisas da ruiva. Anatole, resolveu não prosseguir na provocação. Aquilo já tinha ido longe demais e dado frutos suficientes. Tinha conseguido provocar o russo. Anatole apagou o cigarro no cinzeiro da sala. Mas o que era um cigarro para um acontecimento tão importante como aquele, apenas um cigarro, ora bolas!

- Esse é o caminho meu camarada, esse é o caminho. Livra-te dessa poeira cósmica! Hora de parir um novo mundo!

Parecendo não ter escutado as últimas palavras de Anatole, Vasilli prossegue: - Nato, leva pra tua casa, cuida bem das coisas dela. Pode me recriminar, mas talvez ela volte, ou peça as coisas dela de algum vilarejo da Nicarágua por correio. Sei lá.

- Pode deixar russo, ficarão comigo, bem guardadas. Saiba que isso é um grande passo. Como diria aquele ditado... Vasilli o interrompeu com um acenar de dedo, quase um "chega", beiravam nesse momento, limítrofes emocionais. Anatole resolveu não prosseguir, entendia o recado. Já tinha conseguido o que queria: reavivá-lo. "Pelo menos ele reagiu", pensou.

- Vai agora francês. Talvez te encontre pelos corredores do centro nesta sexta.

- Au-revoir!

- Até.

Anatole fechou a porta. Desceu as escadas. Foi necessário fazer aquilo. Sabia que teria de ser impiedoso. Era pelo bem de Vasilli. Nada seria como antes, mas ele demoraria a entender, o que era compreensívelmente natural. Mas já fazia tempo demais. Ela não iria voltar.

Ele não acreditava nisto; se Vasilli acreditava, tinha lá seus motivos. Mas bem, a ruiva não iria voltar. Ruivas não voltam. Simplesmente não retornam.

Enquanto isso, Vasilli recolhia, de maneira sugestivamente patética, alguns cartões postais soltos, enviados em tempos áureos, tempos onde se podia tomar banho de chuva de janeiro a março à espera de situações limites. Eram dores verdadeiras pelo menos. Dores verdadeiras.

Uma nostalgia o invadiu, mas quem vive de nostalgias... deus... já está perto dos pontos finais.

Enquanto cozinhava um macarrão, o pensamento Vasilliano ia fluíndo...

"Associar melancolia e tristeza com algo ruim é uma prática ocidental. Há um limite muito pequeno dentre estas práticas. O ocidental relaciona aparentemente extroversão com alegria. O oposto, seria a introversão, como algo ruim, além deste parâmetro, atividades ditas introvertidas e que não conduzem o indivíduo a um estado semelhante a de um palhaço no auge de seu espetáculo tornam-se repugantes. Remédios, noites vazias e metade da civilização ocidental está fundada para afugentar este espectro. Até a geografia urbana. Os letreiros coloridos, as ruas iluminadas, o barulho, parte disto tudo."

Teorizava demais. Até mesmo com a segunda ou terceira garfada de macarrão e uma música não tão decadente dos anos 90 no fundo. Era a era dos macacos indo, dos macados vindo, dos macacos que ficavam parados, enquanto Vasilli, não relacionava o fato de apertar botões com o fato da música continuar porque precisava continuar, continuar, enquanto a cerveja preta ia descendo sem vírgulas, sem vírgulas, sem, as, malditas, vírgulas; Cantava alto, esparramado sobre os cartões postais, chorando por cima das folhas de papel soltas, a barba por fazer(não iria fazer), os malditos nostálgicos voando por sua cabeça. As malditas ruivas. Multiplicando-se, e as caixas de papelão no fundo do terceiro armário da cozinha.

A chuva tinha dilacerado parte do que sobrara de si mesmo. Os solavancos do ônibus, a água escorrendo pelos vidros laterais e as pessoas estáticas, um bom fim de noite pelo menos.

Anatole, apoiava a caixa em uma das mãos, e com a outra brincava de desembaçar o vidro do ônibus, desenhando sorrisos estáticos. Estáticos.

Pensava em Vasilli. Sentira pena do russo inicialmente. Era um confuso sentimento de pena e decepção. Onde escondera-se seu ímpeto de reação? Desceu, com a caixa na mão, a chuva molhava seu casaco, protegia a caixa como se fosse o próprio Vasilli, mas que situação patética.

Entrou no apartamento, guardou-as coisas da ruiva com carinho, trocou a roupa e resolveu tomar um banho cantando alguma música da Sr. Madeleine Peyroux.

Os vizinhos como de praxe, escutavam.

sábado, 10 de novembro de 2007

Hierárquicos Sofrimentos

Acordei com vontade de chorar
De comer lágrimas às pausas sôfregas do dia
Sem que mesmo para isto eu merecesse
Por que eu não mereço. Veja bem
Eu não mereço

Quem merece chorar não chora.
Apenas ri
Apenas canta
Dança e faz de seu dia uma batalha diária
Contra a solidão

Nas favelas, beiras de esquina, nas pontes
E nas praças abandonadas não há lagrimas
Sem motivos que as justifiquem
Eu não mereço parir as lágrimas que me espreitam

Já me falaram que cada sofrimento é um sofrimento
E que sem hierarquias
Todos os sofrimentos seriam iguais
Mas há sofrimentos que não são sofrimentos
São apenas lástimas ou caprichos mesquinhos
E com estes não há condescendência
Muito menos condescendentes

Envergonho me do meu sofrimento
Sofrimento pequeno
Insignificante e miúdo
Mas só eu sei
Repito, só eu
Sei realmente sua imensidão

Como nas trevas despedaçados
E interligados pela dor
Hoje vejo
Que todos os sofrimentos são iguais
Por que há então
Um motivo comum
Que odiosamente
Os unem

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

São setores Urbanos

Vasilli precisava parar. Respirar. Sentir o oxigênio invadir seus pulmões com força. Precisava de anestésicos naturais, de ansiolíticos homeopáticos, ao invés de álcool barato, mas ainda não se "iluminara" suficientemente.

Cruzara a Gomes Freire com a esquina da Mem de Sá, desviando-se de calçadas ruidosas e pedestres silenciosos que contornavam os carros estacionados, contornavam a si mesmos já vencidos pelo fazer-se pragmático e prático dos atores urbanos.

"Velhos problemas, velhas soluções", comentou consigo mesmo em tom fatalista.

O nome do bar era "Casa da Cachaça", históricamente falando tinha lá sua importância, tal como a Rua Tonelleros; e qualquer merda de rua possue importância se algum burocrata do MEC ou da prefeitura entram em conluio, assim como a rua Carlos Lacerda, aquele filho da puta de extrema direita, de extrema direita sim, que Vasilli era obrigado a passar próximo às terças e quintas.

O mais importante no entanto, era realmente poder sentar nas fronteiras da Lapa, na parte externa ainda sem glamour, ainda não revitalizada(e que bom) sem ser importunado por meia dúzia de conhecidos, o que particularmente costumava detestar quando desejava a paz. A ansiedade lhe corroía, e isso pareceu atrair rápidamente o garçom; e seja como for que realmente tenha acontecido, o fato importante é que pediu uma cachaça de maçã: "pra aquietar o espírito" brincou em um tom simpático e jocoso que poderia ter sido proferido por alguém, no mesmo bar, há sessenta anos atrás.

Era uma frase senso comum, corrigia-se segundo este racionalismo chato que o atacava vez ou outra, que transformava padrões em padrões e tirava o significado oculto das coincidências, um milhão e setecentas mil coincidências ocorridas em uma semana sem explicações, transformadas em simples acaso, em simples "fora das probabilidades", "exceções". Ciência e estatística de merda.

A mesma que insistia em negar o mistério do desconhecido em prol de uma lógica moribunda, acabava com o abismo e trazia-lhe uma colher, um relógio ou uma aparelho de endoscopia importado da Coréia do Sul.

A ciência era um burro com uma cenoura amarrada, que jamais consegue alcançar-se! Eis a ciência contemporânea. Perdida em vazios que ela mesmo criou. Perdida em sua própria ansiedade.

E nem me fale em ansiedade. Vasilli contava seus trocados e esboçava profundidade em divagações, cigarros e sorrisos; todos óbviamente de duvidosa qualidade.

- A ansiedade é doença da modernidade. É da modernidade, esta merda de modernidade!

- Filha legítima!

Gritava, mas ninguém escutava, fantasmas e murmúrios desfilavam por entre os goles de cerveja.

A música lhe irritava, era uma mistura mal-sucedida de uma tentativa abrasileirada de um pop inglês de baixa qualidade, que o levou a tragar todo o resto da aguardente com vigor de um bêbado semi-profissional. Meu equipamento mental está totalmente viciado - assumia.

Somos viciados. Estamos condicionados como ratos, vagando por cidades sujas, respirando merda, sim respirando merda flutuante, exalada por fábricas imundas, símbolos fálicos flamejantes com rodas e outras porras com néon. Plástico, neon, essas merdas, que constróem templos do dinheiro, do consumo, reunindo cada vez mais ratos, que se aglutinam em torno de luzes, como aquelas vespas estúpidas que rodeiam luzes em dias de verão.

Templos do dinheiro, templos de deuses que vendem cocô misturado com amianto, seguidores mentecaptos, ovelhas e pastores, estética, estética, estética. Gritada, vociferada, por sob os escombros da roda, roda suja de sangue, engrenagens de um vazio: um vazio dinheiro.

Há uma ânsia por destruir, por construir.

A ânsia destruidora é uma ânsia criadora. Com explosivos o suficiente eu explodiria um prédio na avenida central, um templo do consumo durante a noite e evitar-ia milhares de moscas rodearem edifícios semelhantes por no mínimo cinquenta dias com otimismo, um tempo necessário para a mídia construir e instituir novos medos, vender, e enlatar sessenta e cinco ou sessenta e oito produtos pús-modernos que não precisamos. Riu da última divagação: era raivoso demais e ele nunca viu nada mais explosivo do que óleo diesel ou gás de cozinha, talvez até fogos de artifício, mas lhe sobrava ímpeto e a volúpia guardada pelos outréns.

Mais uma garçom!

Lembrara e observava com desdém, alguns atores baratos, criaturas suburbanas que vagueavam fantasiados de revoltados demodé. Não há nem mais romantismo nessa cultura urbana! A cultura urbana fracassou!, está morta. Enterrou-se sozinha. E estamos lutando para dividir seus espólios. O funeral no entanto, não acabou!

A rebeldia não está na imagem, na imagem só há ficção. Com polietileno, metal ou gel de cabelo eu conseguiria atrair todo o ódio de uma festa de primeira comunhão no bairro de Laranjeiras.

Escoteiros se ofendem até com caretas.

Sem as células, sem a porra das células, o tecido já estaria morto. Sem a merda da organização vamos vaguear como bostas. Riu de si mesmo, por que tudo fora do contexto poderia parecer realmente pior do que era, foi por issso que acendeu o segundo cigarro e pediu uma cachaça sabor-banana para fechar seu apetite de vez e torcer para que o sono viesse no princípio do terceiro trago. O garçom evidentemente não gostava, e ele deixava claro quando demorava, ou ignorava os sinais, os gritos, os sussurros inertes, porque cachaça segundo a episteme da gloriosa casa-receptora-de-droga-legalizada-pelo-governo é a que é feita de cana, a de açúcar, a de cinquenta escravos fugidos queimando a casa, o senhor do e o próprio engenho em 1793, antes das Antilhas fuderem a porra toda. Mas ainda restava o Haiti que era um exemplo corajoso; não racionalizaria novamente, se o garçom por princípios epistemológicos obrigasse-o a racionalizar alguma coisa, apenas diria que a cana possui um passado vergonhoso, mas no fundo no fundo o que estava na ponta dos culhões era dizer que a cachaça de maçã era mais gostosa.

O sono não veio. Algumas coisas temos de provocar, não é mesmo? Pensou, antes de observar o terceiro ou quarto grupo de revoltados demodé desfilar por entre as esguias calçadas(seguida de um brinde e um olhar carinhoso para a demodé da terceira fila apesar de Vasilli não estar vestindo a fantasia adequada para o intento afetivo).

Algumas das fantasias usavam óculos quadrados, vestiam roupas encomendadas, americanas, européias, rebeldia vestida; desfilavam-se, costuravam-se cheios de couraças.

Devem cagar Almodóvar no café da manhã. Riu solitáriamente da própria piada, o garçom entenderia, pois era engraçado, ele e a piada. Começou a enumerar o que deveria fazer na próxima semana: estava cheia, cheia de compromissos, vamos mudar o mundo!, dizia em silêncio, vamos, vamos mudá-lo, vamos, vamos correr, e aí ofegava, e parecia um miliciano da guerra civil espanhola, deslocado do tempo e do espaço, e aí bebia a cerveja com mais vigor, era aí, e exatamente aí que uma descarga de adrenalina percorria os brônquios que dilatavam, e aí, lembrava-se de Kafka, Bukowski, Cortázar, Neruda, Pessoa; e a cerveja vinha com mais força e aí, especificamente aí, os sobrenomes de algumas aftas emocionais apareciam por tabela.

Enforquem metade dos publicitários e já teremos um bom começo. Pensou baixo, por que atacar pessoas não era seu intento, gostava de esmagar posições, falemos baixinho - mas ninguém resiste a uma misantropia de vez em quando, é algo de tão bom tom em qualquer situação, desde que se consiga parecer irônico, mesmo com uma péssima má fama.

Odiava os misantropos que levavam sua misantropia realmente a sério, pois eram os primeiros a pedirem abraços em dinâmicas de grupo de psicoterapia; era tão óbvio quanto os ratos se aproximando das luzes de neon, dos óculos quadrados, das calçadas esguias e de todo aquele padrão e aquela fantasia criada apenas para incentivar perfis de consumo e torná-los "especiais".

"Para incentivar perfis de consumo." Falou alto, repetiu mentalmente, bebeu o último gole, amassou o cigarro na mesa de ferro, deixou alguns trocados na mesa e partiu.

Espreguiçou-se mentalmente: "Perfis de consumo... e é apenas isto."

Partiu rumo a um desconhecido, um desconhecido que se ele não apetecia, tornava-se pela força dos fatos insuportávelmente óbvio.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Temas sobre a insônia: Contatos com o Interior

Hoje passei no Largo do Machado. Precisava de 40 minutos de completo ócio, mas é mais fácil preencher espaços vazios com movimento e caoticidade na maior parte das vezes do que com reflexão. A própria geografia urbana não propicia este tipo de tomada de decisão. Resolvi comprar livros, que nada mais são do que uma soma de árvores mortas se formos pensar por um outro ângulo, o que inevitávelmente nos conduz à discussão de que não existe a separação vida x morte. Não chamaríamos a vida de vida e a morte de morte se ambas não fossem no fundo, uma coisa só.

Pois bem, voltando ao assunto dos livros, encontrei uma bela musa de cabelos cor ferrugem, era quase uma ruiva, se talvez levássemos em conta que só descobre-se uma ruiva quando se geralmente está a ponto de perdê-la. É um paradoxo interessante.

Bem, na verdade não podemos chamá-la de quase ruiva, por que era uma mera projeção. O fato é que fui comer um quibe de legumes com muito mais animação que o habitual. O Largo do Machado é cheio de vida e situações emocionalmente carregadas. Assistir uma apresentação de folclore por exemplo faz parte desta situação. Normalmente em época de reis, ou algo assim, nunca fui bom em datas. Coisa que não ocorreu hoje foi algum folclore; teria sido muito mais recompensador, do que comer quibes árabes.

Marco minhas datas com lembranças marcantes. Catarses individuais, situações limite e cartas mal lapidadas, voilá, meu calendário é algo entre isso tudo. Há um quê de passagem no Largo do Machado, algo que é o caminho mas torna-se o fim. É o mesmo com Madureira, porém indubitávelmente com psico-tensões geográficas extremamente particulares.

Há praças do Largo do Machado que ainda são verdadeiramente praças, apesar de dominadas por tipos conservadores e prédios e condomínios que os induzem a esta postura.

Quando a falsa ruiva se foi, eu tive vontade de chorar. Não era um choro própriamente dito. Talvez um insight, uma recordação malquista ou um neurônio e uma sinapse mal-sucedida, o fato é que foi algo tão curto, que não desencadeou nada, particularmente e absolutamente nada.

O que não é uma tentativa pessoal de negação do sentimento. Lembranças surgem é claro. O fato é que como um sentimento pode surgir em milisegundos a ponto de desaparecer em seguida? O que para mim, "ficou na metade", é parte de um gerador, de um verdadeiro gerador de sentimentos novíssimos, e isso é bom.

O fato em si é; transbordar quando assim lhe aprouver. Determinados ambientes podem trazer isto a tona mediante uma relação causal e casual de esforço cognitivo. Isto passa por estar sintonizado consigo mesmo a partir de relações que podem proporcionar este aumento de contato interior. Um contato com o gerador, um gerador de emoções completamente novas.

Talvez um sonho iniciático sufi lhe seja suficiente.

É preciso ter um pó de estrelas dentro de si. É preciso saber que não há sentimento ruim. A tristeza não é ruim. A felicidade não é algo bom. A tristeza também não é boa e muito menos a felicidade seria algo ruim.

Mas elas estão lá. E isso dever ser intensamente aproveitado(e apropriado).

Quando isso for compreendido, o contato estará estabelecido. E será possível viajar por entre o self.

Não faço idéia(racional) do que escrevi exatamente, mas há uma luz que deseja coexistir com a sombra que começa a fazer total sentido para mim(como eu não faço a mínima idéia, aliás, o que é particularmente e cada vez mais interessante).

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Poucas palavras



Ausências.

Apenas,

Ausências.

Vazios.

Espaços cheios

Completos de;

Vazios, vazios e ausências.

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Top 5 - Álbuns Introspectivos

Um top 5 é difícil, convenhamos, há inúmeros cd's introspectivos que eu escolheria, mas estes 5 são definitivamente os que entrariam na lista a partir de questões estritamente particulares. Não sei por que a idéia de me fazer um top 5 me ocorreu(sempre o faço, peguei este maldito cacoete após o filme Alta Fidelidade, eu confesso, mas nunca públicamente).

Confesso que o sr. Buckley entrou a partir de um pega pra capar feio com o Animals do Pink Floyd.

1 - Radiohead - Amnesiac
2 - Cat Power - Dear Sir
3 - Sonic Youth - Washing Machine
4 - Nirvana - Unplugged in New York
5 - Jeff Buckley - Grace

o 5º é honroso ao sr. Buckley, talvez pela frequência com que eu o escute e pelos seus angustiantes agudos, sua biografia confusa, fugaz e suas letras clichês que tanto me agradam. o 4º lugar é merecido, apesar de batido, este cd ainda me traz algumas lembranças incômodas, que cimentaram toda a metade dos anos 90. É um marco nos cds introspectivos, foi aí que tudo começou. Em 3º lugar temos o poderoso Sonic Youth, apesar deste cd ser normalmente desmerecido pelos fãs em geral do S. Youth, o acho de um brilhantismo exasperado, uma fase do Sonic Youth que provávelmente não se repetirá jamais, o que já é digno de figurar entre os três primeiros. E aquela voz sussurrante da Kim está completamente arrasadora. As guitarras sintetizadas, enfim, perfeição! Escolher algum disco da Cat Power também não foi tarefa fácil, o que lhe confere sem esforços o segundo lugar, numa fase em que a mulher exalava tristeza e melancolia, o Dear Sir será(anotem isto) uma exceção dentro dos próximos trabalhos de uma Chan Marshall mais soul e digamos feliz(o que fez questão de afirmar no Tim Festival deste ano). Cds angustiantes e profundos como o Dear Sir talvez tornem-se mais raridade...

E the winner is...

Inevitávelmente algum cd do Radiohead entraria, eu pensaria em mais dois nesta lista; Kid A e Ok Computer, contudo determinei a regra de 1 cd por banda, para tornarem as coisas mais justas. Talvez me perguntem por que não coloquei a perfeição dos anos 90, o aclamado Ok Computer. Sinceramente, sempre gostei muito de material outside dessas bandas. No caso do Radiohead isto é virtualmente impossível, mas é fácil eleger o Amnesiac como a coisa mais angustiante e introspectiva que já ouvi na vida pelas condições(O novo In Rainbows ainda não foi suficientemente digerido para isso).

Experimente morrer de frio numa aclamada viagem em homenagem aos aninhos do movimento punk(isto há seis anos atrás), dormir no chão de um ateliê sujo, estar completamente imbuído do espírito hardcore do evento e ainda assim escutar Amnesiac pela primeira vez e simplesmente pirar. Foi isso que me aconteceu(Há dois momentos em minha vida, A. A e D.A, Antes de Amnesiac e depois de Amnesiac). E por esses e outros motivos, AMNESIAC ganha indiscutívelmente seu posto no top 5. E você? Qual é o seu top 5?

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Dos primeiros ou últimos encontros

Não sentia-se particularmente triste, contudo não era euforia, muito menos excitação. Apagou as luzes e resolveu caminhar um pouco, arejaria um pouco suas idéias. Era difícil explicar, não era dor, nem sua antítese. Muito menos apatia, por que não lhe consumia de maneira tão efetiva a ponto de proporcionar um comentário mais audacioso.

O apartamento, estava quente, um pouco de vento lhe faria bem, faria realmente bem. Quem sabe uma cerveja. Talvez.

Passou num pequeno mercado, comprou cervejas, cigarros e caminhou até a ponte. Uma ponte quebrada, onde conseguia apreciar bem um pouco da lua, um pouco daquela brisa do mar. O cheiro de cidade pequena era cada vez mais nítido.

Sentou num banco simpático, próximo ao centro da praça, podia assistir a lua cada vez mais nítidamente. Depois do terceiro gole pensou consigo que sim, a ruiva poderia aparecer.

Mas isto são projeções. Ruivas não aparecem dessa maneira, clichê. O máximo que posso fazer é olhar a lua e me satisfazer com elucubrações. (e racionalizar um conto é matá-lo totalmente pensou)

Recuso. Recuso sim, elas podem aparecer. Este é o meu conto, é minha vida. Talvez elas apareçam. Há um pouco de Vasili em todos nós pensou. Há uma Laura escondida em cada esquina, clamando por revelação. Mas nunca, eu disse nunca, definitivamente nunca, retirem os mistérios da vida. Matem a ciência, matem a psicanálise, matem o que for preciso(exceto o ser humano), mas permitam que o mistério exista, sem o mistério não haveriam cores. E cores são essenciais. Papéis laminados são invenções estúpidas, refletiu antes de abrir a próxima cerveja, cartesianamente falando.

Cortaram-lhe o pensamento de maneira súbita, estrondosa, um som metálico de pedais o que revelava sua total desatenção para com grande parte da realidade, com na verdade, uma bicicleta branca. Era a ruiva pedalando.

Usava um short curto que lhe caía bem, uma camisa larga demais, não estava com sutiã, e dentro da cestinha da bicicleta carregava morangos. Inicialmente tratou de pensar que era uma cena demasiadamente estúpida, mas a ruiva tratou de contornar toda a estupidez dos sentidos com seus trejeitos que encantavam metade do universo(aliás pensou o quão contraditório podia ser algo uniforme e múltiplo ao mesmo tempo... uni - verso). Ou seria um único verso? Além disso o sorriso da ruiva era capaz de tornar a cena mais ridícula possível na obra de arte mais interessante, na memória mais viva, e quem não vive de memórias... Memórias são fundamentais.

No momento em que a ruiva ainda fazia sinais com as mãos indicando cansaço e inclinava metade do corpo com a respiração ofegante, uma das lâmpadas de um dos postes da praça apagou e ele achou de certa forma(odiava esta palavra, de certa forma, lembrava fôrma e ele escreveria mentalmente errado para lembrar que algo que forma não pode ser bom de nenhuma forma) que isto foi um elemento síncrono, ou seja, resumidamente de relevância para ambos; mais para ele que pensava, do que para ela que pedalava apressada naquele momento, se ajeitando desajeitadamente com os morangos e a bicicleta cambaleante em uma das mãos.

Lutava para fazer com que o descanso da bicicleta mantivesse a bicicleta de pé, mas em vão, necessitou que Vasilli ajeitasse a bicicleta antes de iniciar o seguinte passo, não tão sincrônico e não tão perfeito como toda projeção deveria ser.

Com energia e vivacidade, a Ruiva mexe os peões:

- Oi.

- Oi.

- Gostou da minha bicicleta?

- Sim, quer dizer(mexeu a cabeça em tom de ironia), está de acordo com a situação(sorriu para deixar a cena mais agradável).

- Bobo. Eu trouxe morangos.

-Eu trouxe cervejas, apontou para as latas vazias.

- Está bem, me dá uma latinha, apontou a ruiva, antes de escorar-se sentada com todo seu típico descompromisso sob o banco da praça.

Era um medroso. Bebeu aceleradamente para evitar maiores diálogos. A ruiva tinha esta capacidade, de lhe manter constantemente num jogo de xadrez, onde deveria, mesmo que inconscientemente pensar e repensar seus diálogos, saber que palavra usar, não desagradá-la, mostrar se inteligente, suave, tolerante, deus, sabia que tudo isto não funcionava! Teria de ser natural, mas como ser, e fingir ser natural, com alguém que lhe tirava do padrão. E se o padrão é o natural, jamais conseguiria manter-se dentro do padrão.

Tinha medo, talvez quando a ruiva descobrisse quem realmente era, olhasse para seu âmago tudo ruiria. Mas tudo já estava ruindo. Era fácil falar de descompromisso e de liberdades amorosas quando a ruiva era um modelo para todos os envolvimentos futuros. Encontre uma jóia rara e saberá o que estou dizendo, pensou. Jóias raras são únicas. Padrões, cópias, pessoas iguais... Já conhecia muitas. Era fácil ser livre com os padrões. Difícil era abrir exceções às exceções, difícil era abrir mão do inédito. Ninguém quer abrir mão do inédito. O inédito é o inesperado e o inesperado faz parte do segredo, do mistério, que são sustentáculos básicos da vida.

Voltou ao assunto. Quando a ruiva, já virava a latinha de cerveja de maneira ruidosa e irresponsável, como ele realmente adorava, e era realmente adorável. As gotas fujonas, escorriam por seus lábios, enquanto ele lembrava que há duas semanas atrás, escutou sua música favorita, e não pode deixar de lembrar da ruiva. E lembrou que talvez não estaria ali caso ela tivesse sumido, digo aparecido(é da capacidade do conto e dos contistas inverter quaisquer tipo de situações, a palavra é pois uma serpente...).

A ruiva bebeu. Ele também. Abraçaram-se, ela acariciou seu pescoço e ele passou a mão lentamente sobre seu cabelo, beijaram-se sem importar-se muito com a praça, com a bicicleta, ou com as cervejas jogadas. Eram apenas motivos, adereços muito bem colocados pelos próprios.

Pensou outra vez o quão amador era nesta arte. Dos mais principiantes. Ainda estava se descobrindo, descobrindo seu papel no jogo.

Largaram os morangos de lado, sorriám, enquanto estes caíam, a bicicleta e os beijos também... Os abraços fortes, os transeuntes passavam como objetos próprios de um conto que ambos criavam e toda aquela imperfeição parecia preencher-se de sentido. Resolveram passear com a bicicleta, com os morangos e com os sorrisos estampados na alma, a praça era pequena demais para um amor que ocupava o centro de suas emoções, o centro da cidade, o centro de suas vidas. Era um universo que construíam, que apesar de já existente consideravam-se em seu tabuleiro, com suas próprias regras, no centro.

Vasilli lamentou apenas ter acordado e revelado por meio de três ou quatro páginas com as devidas alterações gramaticais algo que não deveria ser racionalizado, mas teria de permanecer no centro de seus sonhos e de sua psiquê.

O último trecho da carta enviado, revela bem seu desejo: Jamais racionalizem seus sonhos. Matá-los é matar a si próprio. Sonhar é viver de "certa forma" plenamente.