segunda-feira, 30 de junho de 2008

Justine: a outra

Não conseguia nem escrever, mas podia pensar, e isto no ponto em que se encontrava era algo bom. Inculto boteco de fim de noite; não haviam relações sociais novas, apenas reproduções, reproduções, reproduções... E quando tudo estava ruim ele bebia cerveja na quinta ou na sexta e resolvia tomar um porre no sábado. Desistia antes. Nunca ia até o final, andava em círculos, "quem anda em círculos, não ultrapassa a linha limite", sábias palavras ruiva...

Tinha uma cláusula de segurança, incômoda e febril, permanecer nas bordas, nas periferias, observar, observar...

A ansiedade retornava e ele trabalhava, por que era o que sabia fazer quando ela aflorava. Sentia falta da depressão, sim podem rir, talvez para Vasilli era a única coisa que poderia pará-lo(e mesmo assim não conseguia). Estava cansado, não imaginava que o desapego iria lhe afetar tão duramente. Sentia falta da melancolia. Odiava este estado intermediário. Nem euforia, nem alegria, nem depressão nem felicidade: o caminho do meio era um porre de vinho, uma noite de sexo ruim, um objetivo sem causa: um incômodo meio-termo.

Silêncio no quarto. Em si mesmo, havia barulho. Um barulho interior que não cessava; sua mente era um campo de batalha.

Queria corromper a rotina, ir até o fundo, desistir no final de semana, não ir além.

Falsas ajudas, falsas amizades, mas ele ainda tinha seu núcleo duro: nesta hora conta-se nos dedos, e nem precisamos de todos de uma mão. O núcleo duro é sempre um pequeno grupo de fudidos, gente honesta, mas que perdeu. Perdeu por que não pode mais competir. Gente que finge vitória em comentários otimistas em filas de banco mas que percebe, não objetivamente claro, mas pela intuição que a epidemia da competição está matando os perdedores aos poucos...

Apesar da verdade, incômoda verdade, juraram inconscientemente proteger uns aos outros, enquanto um cai, o outro levanta(ou finge levantar), trocam-se as muletas, refazem-se os caminhos, os copos de cerveja se enchem, a ansiedade baixa e o círculo retorna ao seu ponto inicial.

Situação difícil passava Justine, Justine, "la Violeta", amparada e protegida por meia dúzia de bajuladores. E ele o egoísta sincero, não conseguia nem amarrar os cadarços sem lembrar se havia ou não enviado a carta para a Ruiva, apesar do que apreciava o sexo casual com Justine.

Gostava de seu bom humor, adorava sua maturidade precoce, seu jeito espontâneo e sincero, que transparecia uma irresponsabilidade suicida que animava o pragmatismo das terças-feiras.

Não haviam princesas para salvar, nunca houve, não haviam encontros casuais(frequentamos sempre os mesmos lugares) não havia distração recompensada(que dependia de talento) e nem mesmo recompensas profissionais(estava desempregado), por isto apelava a Justine e era até divertido em certo ponto, um ponto que ele nunca pensou bem exatamente se chegaria a algum lugar, mas era sempre garantia de prazer egoísta aos dois.

Esperava a ruiva voltar para encerrar um ciclo, mas a demora era tremenda, talvez ela não voltasse, e devia ter esta possibilidade em aberto.

Por isto Justine e seus asseclas, seus lacaios lhe pareciam intensamente irritantes, provocando-lhe uma soma de decepções, pois eram meras reproduções, meras fotocópias indulgentes fantasiando mundinhos enlatados, frequentando as mesmas festas, realizando os mesmos rituais, provocando as mesmas possibilidades e por fim, odiava o modo como Justine se despia e odiava quando ela gargalhava além dos limites sociais.

Odiava a si mesmo. Odiava vodka com refrigerante. Odiava escrever com gente olhando. Amor odeia amor. Ódio amava o amor. Amor amava o ódio. Ódio odiava o amor. Era tudo meio paradoxal. E usavam palavras bonitas.

E ele prosseguia. Amando Justine; um amor de quinze, vinte minutos, mas sincero, extremamente sincero.

domingo, 29 de junho de 2008

Negras Tormentas Agitam os Ares

E eu só quero que o tempo passe e o mês acabe. Parece simples.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Tempo

Ontem, hoje
Amanhã
Já andou o relógio!

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Paciência

Às vezes acontece
Olha-se para o tudo e não se enxerga nada
Às vezes é outro alguém que vê
Melhor que você

Por que seus olhos estão perdidos...
Perdidos num caminho
Que você achava correto
E aí, tudo parece absurdo

O que antes era confiante, coerente
Vira de ponta a cabeça
E você já não sabe mais o que fazer
Ou para onde correr

Nestas horas é preciso saber esperar
Mesmo diante do olho do furacão.

Nestas horas...
É o destino que deve dar o próximo lance

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Uma carta dela para mim - A Pergunta

Você precisa abrir mão. Precisa abrir mão obstinadamente, precisa abandonar e fazer disto um cotidiano. Precisa rodopiar sob seus opostos, invertê-los de maneira apaixonada.

Precisa ser o que odeia para compreender. Tornar o que você é implica em me reconhecer, mas você nunca, nunca... jamais o fez, mesmo quando eu recebi seus beijos, mesmo quando eu tomei café da manhã no pé da cama; e até mesmo quando você me bajulou com o Neruda, eu sabia, eu tinha a certeza, de que aquilo não era para mim. Era para você.

Você massageou o meu(seu) ego. Você dançou sob a escuridão para si mesmo, não para mim.

Você não me amou, você encontrou uma parte de si que parecia encaixar... E eu não tive tempo, mas agora tenho, não sou um quebra-cabeça; eu sou um jogo de armar.

Amai-vos uns aos outros como eu me amei. Amai e recebei, e você fez jus ao egoísmo, fez jus às complicações, fez jus ao duende que corria entre vós, apesar de tê-lo ignorado solenemente, com um tom de desprezo e arrogância bem característicos.

Gostava dos seus autores preferidos antes mesmo de você, mas você exigiu destino, conjecturou sincronicidades que não existiam e arquitetou perfeição aonde só existia acaso.

Racionalizei sim, racionalizei aquele momento por que era a única forma de lhe salvar de si mesmo. Você já estava condenado, e a única forma que eu encontrei foi matar o Eros(eu não o matei você está me entendendo?), Eros que você apreciava como irmão, mas que usurpava e lhe oprimia: você era não só um escravo de suas paixões, mas um Ícaro pronto a despencar. Eu não retirei seus projetos e nem suas asas: você é um Da Vinci orgulhoso mas continua original.

Tudo tem seu preço, você sempre soube, sabia desde o início que eu iria cobrar com juros. E foi o que eu fiz. Você não seguiu seu conceito de palpável. Você voou e desafiou as nuvens. E eu só escrevo isto aqui, por que deu errado me entendeu?

Os vencedores terão outras explicações... mas não se trata de uma disputa de objetivos. O alvo é a origem.

Você nem vai terminar de ler isto aqui. Você sabe, eu sei.

Por que gente humana escreve a realidade com os olhos.

Saiba...Foi melhor deste jeito. Você chegou até aqui, sabe que se ultrapassar a linha limite não haverá retorno. A linha limite não existe, por que você não caminha em linha reta...

Você anda em círculos.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Moisés entregava gelo

Moisés era entregador de gelo. Sim, gelo. E vez ou outra pensava, que emprego era pior do que aquele.

Levava gelo, recebia e distribuía friezas.

Parava e bebia cerveja sozinho, sempre sozinho. Todos estranhavam.

Moisés não frequentava igrejas, detestava seu nome e os santinhos que recebia na rua fora do horário de trabalho.

O homem dentro da caixa


Na Lapa, centro do rio, um homem dorme dentro de uma caixa: Abdômen para fora, cabeça para dentro. Verídico, terrível.

Eu caminho abdominalmente; já perdi minha cabeça na caixa do homem.

Homem? Homens? Mas que papelão!

Ao lado uma placa lhe diz: "Secretaria de Gestão Penitenciária".

E mais adiante um hotel chamado Hilton grita carros importados na calçada; alguns passos para a esquerda, e vejo bancos, caixas eletrônicos e vidraças que pedem... pedem...

E eu só quebrei os retrovisores; sou um covarde sem abdômen!

Sou uma caixa! Uma caixa de papelão!

quarta-feira, 18 de junho de 2008

O ponto limite, a "dead line"

As coisas estava monótonas Ruiva, monótonas como sempre lhe pareciam, até que momentos antes o desencadear dos fatos contradizia não só a realidade, mas impunham uma nova percepção. Uma percepção irônica, jocosa. Forjada em algum lugar secreto, inacessível para nós, dois mortais que brincávamos de semi-deuses nos finais de semana.

Era como um jogo de dominós, onde os números não poderiam ser memorizados e a cada partida os adversários se encontravam no ponto zero, ou seja; por mais que jogassem, nunca dependiam de suas próprias capacidades ou experiências, mas apenas do desenrolar secreto(se é que isto poderia existir) das combinações, das casualidades, dos encontros e desencontros não arquitetados, enfim da sorte, da maldita sorte.

Era exatamente neste ponto, que eu percebia, e nisto eu achei a princípio que era mais eficiente que você, que algo, não algo tão espetacular no sentido de presentes de natais escondidos atrás de mesas, muito menos velhas cartas que descobertas infrigiam regras básicas dos horizontes de expectativa, iria acontecer. Chamávamos de momentos limites, isto quando não estávamos nós dois bêbados, sorrindo, minto, serei mais sincero, gargalhando, perdidos em quartos de motéis baratos, envolvidos nus por colchas evidentemente de mau gosto.

Nunca sabíamos exatamente o roteiro para estes momentos, por que sempre inventávamos coisas novas, como furar os pneus do carro do yuppie atrevido, ou colocar fogo no brinquedo homo-erótico com rodas do filhinho de papai raivoso, que acabara de ser estúpido com o assalariado sincero e gentil do hotel local.

De certa maneira, perdíamos muito mais tempo e isto era algo que crescia exponencialmente, a falar de ações pretéritas do que própriamente em executá-las, por que o risco ficava maior, crescia e nos intimidava até um ponto quase insustentável, e aí retornávamos ao ponto inicial, chutando o tabuleiro como força...

Recomeçávamos o dominó irracional, sempre com a mesma ousadia, sempre com o mesmo amor, sim amor, pois nada explicaria racionalmente aquela gana com a qual vivíamos, um mundo que parecia prestes a se acabar para nós dois, mas continuava vívido, recheado de sentido, pois sabíamos exatamente o que fazer; não como fazer, isto aprendíamos cotidianamente, mas estava claro que havia um sentimento mais forte que envolvia nossas ações, nosso romance inabitual, nossos beijos desencontrados no meio da rua e sim nossa disposição para fuder as estruturas, mesmo que limitadamente.

Quando começamos a aparecer na televisão, eu não sabia mais o que te dizer, não parecia você exatamente naquele retrato mal feito(você era muito, mas muito mais bonita pessoalmente); as coisas começaram a esquentar, mas isto nunca abalou nossas convicções, talvez remodelou-as para objetivos mais concretos tomando todavia um caminho mais complexo que implicava em ceder.

Coisa que pessoalmente não estávamos dispostos.

Você entendeu mal, quer dizer, era o que eu achei, quando você sumiu. Ceder não incluía me abandonar, na época eu tive de mudar tudo. Tive de viajar para outro lugar como você fez, eu poderia ter ficado, talvez seria preso ou morreria, mas acabei "entendendo" seu recado. Decerto se tivéssemos permanecido unidos, estaríamos mortos; era uma pulsão de morte que me corroía, você sacou tudo novamente, ponto para você. Afastando-se, conseguiu não só sobreviver, mas manter-me vivo...

Claro que compreendi, e agora isto fica cada vez mais claro, que um retorno seu, era um novo processo. Você teve de sumir, teve de me esquecer abandonado num lugarzinho hipócrita do lado de perdedores como Anatole, teve de manter-me como um quebra-cabeça fora do lugar, por que enfim, o tabuleiro não estava para nós ruiva... não mesmo...

Não sei como será: talvez você volte, pode ser que fique de vez bem longe de mim, o que decerto não me agradaria, é óbvio no entanto que eu achava que tinha ultrapassado a linha limite, a dead line, mas sempre se pode girar sob seu próprio eixo, se é que existe algum eixo que não esteja aí, pertinho de onde você está.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Nos quartos de motel

Quando assaltamos aquele banco, os expropriados reagiram, falaram que a propriedade privada, um bem inalienável e santificado fora corrompida por uma meia dúzia de anarquistas expropriadores; eu sacudia o controle remoto e sorria, sem camisa, deitado na cama, enquanto você tomava banho, e eu podia escutar as gotas, o barulho do chuveiro e a sua interrogação preencherem todo o ambiente: Está passando? Está passando? Você dizia.

Nunca falávamos de nós mesmos nestes momentos, nos esquecíamos dos "nós" pelo bem do coletivo, apesar do que, eu sempre pensava, que a linha tênue entre o coletivo e o individual sempre se esgotava nos finais de semana.

Eu dormia sempre pensando no amanhã, e sinceramente desistia de escrever, de falar, de trabalhar muito, por que a música árabe, os livros romenos e toda a eventual anormalidade que perspassava nossas vidas recheadas de um cotidiano inesperado, pareciam desenhar que as segundas não eram própriamente segundas, as quartas podiam ter gosto de domingo ou vice-versa... já que as eventualidades produziam seus acasos tão particularmente interessantes.

E eu sorria, mesmo sabendo que o fato de você sair nua, completamente nua, apesar do que sua mente sempre estava vestida, conseguia eliminar toda tensão, mesmo que eu fingisse o oposto, e você repetia o "que foi", o "Que foi?" que crescia, e fazia sentido, segundo após segundo, quando acabávamos nos amando despreocupadamente dentro de um quarto pobre de cortinas e papel de parede, mas repleto de paixão, sim, de paixão.

Aí eu acaba, fazendo os mesmos elogios, acabava retirando sua toalha molhada, você acabava sorrindo, me repreendia, ou às vezes até me odiava intensamente, o que provocava a necessidade de uma cautela, e invariávelmente acabávamos ou conversando ou nos amando(isto dependia essencialmente de nossos humores tão diversos).

Quando você me negava em desculpas, era óbvio, que mesmo devido as condições externas, estava apoiando suas subjetivas vontades em condições gerais e objetivas que conseguiam mascarar um pouco de vingança parcelada(eu também fazia isso).

No final acabávamos, ou começávamos, um jogo de cafuné, uma massagem, e o dia posterior sempre era muito mais positivo, por que ou eu levava o café na cama, ou você me dava um beijo enquanto eu fingia sono.

Seus cabelos molhados, sua blusa cinza, seus humores tão variados, eram tão apaixonantes, que eu podia carregar todo aquele dinheiro expropriado sem medo de ser reprimido.

Eu não tinha medo, por que quando você estava do meu lado, tudo parecia fazer sentido.

O mundo era fácil.

sábado, 14 de junho de 2008

Falta do que escrever

Bela idéia. Meus dedos não chegam. Não há concentração. Olho para cima, para as estrelas, me sento sozinho, eu respiro, bebo água.

E nem um conto, mas nem um conto, consigo acabar...

Gênio.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Supersticioso

T'esconjuru pé-de-pato mangalô três vezes! [na madeira]

(pode ler agora, querido leitor)

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V

O que se vê

Granito
Amor e miséria
Quase invisíveis

Uma rotina siberiana

Quando acordo, sinto falta de algo. Mensurávelmente pobre e ridículo.
Um abraço, um afago, um beijo de despertar, que jamais surge, mesmo com o cotidiano tocando às seis horas da manhã.

Quando eu durmo, não sinto falta de nada, além de mim mesmo. Há um travesseiro na cama, um lençol velho; uma preguiça de pensar sobre si mesmo, e três ou quatro cervejas vazias sobre a mesa, em dias de moderação, em dias de pretérita moderação.

Quando eu não durmo e não acordo, sinto falta de algo. Que não sei bem mais o que é. Uma foto, uma presença, uma lembrança...

Eu não apelo ao afago, ao abraço, às cervejas, e nem mesmo rezo ao cotidiano...

Por que são todas provas ridículas de fugirem de algo que só encontrarei, em mim mesmo.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Pobre Pierre

Priscila!! Porque principiou perjúrios prejudiciais para Pierre? Paixão perdida pode produzir particularmente pesados problemas pessoais!

Pobre Pierre! Pernoitado pé-de-cana, penalizado pela perda pretérita, pronto para provar pelos porquês pessoais, passividade, perdição, perturbação, percalços!!

Profissão? Perdedor! Pouco! Pierre... Pobre-diabo! Permitiu patéticamente povoar pensamentos... pilhas! Provou paixão para Priscila: perfumes, películas, peripécias! Planejou passeios! Permitiu provocações! Prescindiu pilhérias populares! Produziu palavras...

Pierre pavimentou projetos! Pensava positivo! Priscilla palmeava pacientemente... Preparava pesados pagamentos para pobre paixão passageira!

Perguntou para Pierre por que podia permitir prematura paixão! Poucos passos... pouca presença... Poucas possibilidades plantadas!

Paralisado Pierre pediu perdão! Proclamou poderosa paixão!

Porém Priscilla postergava pedidos... Pragmática, prática, porto-alegrense prevenida... Preferiu preterir profundamente Pierre! Predestinado Pierre!

Pessoas problematizaram: Paixão precisa palpabilidade! Prevenção!

Pedestres palpitavam: pura palhaçada!

Pierre proclamava por portões, pistas, parques...

Puta que pariu Priscilla! Puta que pariu!!!

sábado, 7 de junho de 2008

Concretismo que falhou

Uma nota de cinco pratas na mesa.
Um barulho no som, no ouvido.
Água no estômago.
Pouco rancor.
Andarilho.
Cerveja.
Som.
Foi.
Foi...
Então...

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Palavras ao vento

Há um ponto em específico em que explorar a escuridão sem lanterna é muito mais reconfortante...

A carta de despedida

Tinha uma tarefa simples: escrever uma carta.

Sua carta não tinha destinatário, não no envelope, o atendente reclamava.

A destinatária existia, mas a carta nunca era enviada em seu nome.

E foi aí então, que o pobre remetente tornou se destinatário; na verdade sempre foi desta forma, mesmo que negasse vez ou outra diante da caneta e do papel.

Ele sempre fez tudo para si mesmo diziam as bocas: quando amava amava a si mesmo, quando escrevia para ela, escrevia na verdade para si próprio, quando cozinhava ou levava café da manhã, estava era agradando seu umbigo.

O correio não entendia, o carteiro ficava confuso e no final estava abarrotado de cartas que enviara para si mesmo.

A tarefa era simples e ainda assim ele(eles) resolveram complicar tudo, com a distância, com as cartas, enfim, com as coisas tortas e sem nexo de que são constituídos os correios.

Sim, pobres correios.

terça-feira, 3 de junho de 2008

O peso do mundo

Eu olhava nos teus olhos
E você, tão honesta
Reforçava a mesma impressão
Que tínhamos do mundo

Desigual, injusto, voraz...
Algo tinha de mudar

Quando fazíamos poesia
Fazíamos nas ruas, ao lado do povo
Da lama, da luta

E ainda assim, faltava-me fôlego
Fôlego que lhe sobrava
Toda vez que eu o buscava em teus olhos

Quando você foi embora
Não pude mais dividir
O peso do mundo
Com a tua presença

Só me sobraram a memória
As estrelas, e as calçadas, muitas sem vida

Neste ponto, e particularmente neste ponto
O mundo tornava-se muito mais injusto, desigual
E voraz
O peso do mundo aumentava

Eu esquecia meu socialismo libertário
E naquele momento, era só mais um
Mais um reclamão egoísta
Que nem me lembrava mais
Do peso, do peso do mundo

domingo, 1 de junho de 2008

Agora ele entendeu

Te amei tão vigorosamente...
E eram cinco minutos...
Que eu transformei em quinhentos!

Mesmo em quinhentos, diziam os sábios...
Não é tempo suficiente para amar ninguém

Por que quando se ama, o tempo parece não passar
Mesmo para os céticos, ou para os que constróem
Ou adiantam relógios

Constróem relógios e constróem amores
Inventam fazendo, rejeitam as cores/dores/humores
Ou toda a palhaçada que rima

Por que cinco minutos são suficientes
Para escrever uma poesia ruim

Mas não para amar...

Por que ninguém escreve poesias ruins sobre o amor
Quando realmente ama

Multidão vazia de vozes internas

Eu converso comigo mesmo nesta noite fria e vazia.

Mas quem disse que estou sozinho nessa multidão de gente que consome meu hábito?

Roído pelo anonimato, minhas palavras ecoam distante, num vazio de letras indiferentes; não há piedade para o inédito, mas há cerveja farta por sobre a mesa.

Eu me embebedo para ignorar a multidão vazia, as letras indiferentes, os que consomem meu hábito e para claro, aguardar o inédito, mas nada chega, por que nada chega quando se realmente espera ou se trabalha para algo chegar.

O inédito é filho do acaso, e o acaso não perdoa a ferrugem de gente ansiosa.

Eu sento, choro, e durmo, não necessáriamente nesta mesma ordem de ficção.

[um bom título não faz um conto mediano]