segunda-feira, 5 de maio de 2008

Zapata nunca morreu

1919

Cuautla

ESTE HOMEM ENSINOU-LHES QUE A VIDA NÃO É APENAS MEDO DE SOFRER E ESPERA DE MORRER *

Teria de ser à traição. Mentindo amizade, um oficial do governo o leva para a armadilha. Mil soldados estão esperando por ele, mil fuzis o derrubam do cavalo.

Depois é trazido para Cuautla. Mostram-no de barriga para cima.


Os camponeses acodem de todas as comarcas. O silencioso desfile dura vários dias. Ao chegar frente ao corpo, param, tiram o chapéu, olham cuidadosamente e negam com a cabeça. Ninguém acredita – falta uma verruga, sobra uma cicatriz, esta roupa não é dele, pode ser de qualquer um esta cara inchada de tanta bala.


Os camponeses cochicham sem pressa, colhendo palavras como milho:


- Dizem que foi embora com um compadre para a Arábia.

- Que nada, que o chefe Zapata não foge.

- Foi visto pelas montanhas de Quilamula.

- Eu sei que dorme numa cova do Morro Preto.

- Ontem à noite, o cavalo estava bebendo no rio.

Os camponeses de Morelos não acreditam, nem acreditarão nunca, que Emiliano Zapata possa ter cometido a infâmia de morrer e deixá-los sozinhos.

* Fragmento extraído de “O Século do Vento”, de Eduardo Galeano. Porto Alegre, LP&M, 2005. Eduardo Galeano, conforme indicação no livro, utilizou-se da obra de John Womack Jr. “Zapata e a Revolução Mexicana”, para a sua composição.


(agradecimentos ao Fábio, companheiro de graduação que me enviou por email!)

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