O quarto fedia a incenso barato. Anatole chegara às três e meia da manhã, com o maço de cigarros amassados no bolso, enquanto ouvia a vizinha entoar um Guantanamera sofrível que lhe dava vontade de espancar a velha do quarto 18 para talvez incentivar a cubana sofrida a abandonar a carreira amadora de cantora de cortiço 153. Claro, eram só elucubrações, Anatole era o homem das idéias, Vasilli o homem da ação, este sempre citava sua coragem em tom de ridicularização, o que não agradava decerto Anatole, mas o fazia queixar-se consigo mesmo dentro de sua posição no tabuleiro do jogo. Mastigava amendoins vendidos por um peruano insistente, enquanto imaginava Vasilli esbaldar-se com Laura durante toda a noite, este Anatole, um perdedor necrofágico, imaginava Laura, lassiva e potente com seus cabelos vermelhos metamorfoseados pelo seu humor tão brilhante, rolando como dados na noite, envolver o velho Vasilli, digo Anatole, digo Vasilli, num balé de auto-destruição e vontade orgástica. Quantas vezes assistiu Vasilli lubridiá-la em troco de trocos metafísicos. O puto escrevia e falava com o estômago, por que Anatole nunca reparara que Laura era o ácido clorídrico que faltava neste monólogo profano e vazio, que enciumava-o pelo fato dela ser uma deliciosa amante... uma amante metafísica é verdade... mas era uma deliciosa visão, enxergar aquela mulher dançar, dançar, dançar em torno de joelhos lassivos, olhares perniciosos que faziam os marmanjos de bar(mesmo acompanhados) ensaiarem olhadelas fugazes em torno de propagandas invisíveis, só para compartilharem(não tão bem quanto ele compartilhava diga-se de passagem) um pouco daquela sacro-santa beleza.
Uma beleza culpada.
Uma beleza que não armava-se na mera artificialidade dos anéis do destino, era simplesmente uma aura de lassividade e luxúria vermelha que contaminava os ambientes... Vasilli era um fraco, um perdedor nato para o joguete competitivo do mundinho reduzido dos "homens de bem", dos filhos da puta bem sucedidos, dos "escolhidos", "the chosen one', etecetera, etecetera, etecetera.
Entretanto lá estava o puto, divagando em russo seus sonhos, alimentando Laura com espasmos de sinceridade que acompanhavam fragmentos perdidos. Emoldurava frases de Baudelaire em polonês ou alemão, isso fazia Laura impressionar-se, momentâneamente(que sacana! ele poderia fazer melhor se tivesse todo o despreendimento suicida de Vasilli). Enquanto Anatole, o pobre Anatole, filho da senhora Justine, vendedora de Nabos-farmacêutica-prostituta-suicida, não nesta mesma ordem, este pobre ser que sonha, que ilude-se com este triângulo que não existe, demora a perceber, a se "aperceber" que o lítio que o dr. avental branco recomendou durante as últimas semanas não deslocou a intrigante e deliciosa vontade de entender e usufruir deste amor doentio que só o pobre-rico Vasilli poderia às três e trinta e cinco dominar. Na verdade, sua coluna dói, sua melhor aproximação hormonal fora um olhar a trinta e cinco graus no ônibus que rodopiava a avenida rio branco, como quem gira e escapa em torno do passado... com as carruagens, com os coxeiros e o "boulevair" improvisado que o fazia lembrar a velha paris, em distintíssimos momentos diga-se de passagem.
Acendeu um cigarro e olhou para a janela, sua visão era privilegiadamente desonesta, um prédio com uma tênue luz no terceiro andar, refletia aquela decadência usual do centro da cidade.
E Vasilli, Laura, os dois, envolvidos como tumores... divisões de células não apropriadamente habituais.
Anatole pois bem, e seu cigarro, pensavam que as analogias coercitivas eram parte de um processo intenso que o levavam até a velha monografia "les configurations allemandes dans l'exécution du sade principal", era um dia quente e o decanato de literatura o observava como leões em arenas romanas.
Quanto tédio. O cigarro no fim. Laura e um orgasmo vermelho. Vasilli na cama lendo Gutiérrez ou talvez Schopenhauer antes de emendar um soneto barato que ele escrevera num momento de fleuma. Impressionismo barato.
Anatole imaginava demais. Demais. E quem pensa demais, citava-se, "precisa dormir cedo", expirou em tom de desabafo. Precisa dormir cedo.
Uma beleza culpada.
Uma beleza que não armava-se na mera artificialidade dos anéis do destino, era simplesmente uma aura de lassividade e luxúria vermelha que contaminava os ambientes... Vasilli era um fraco, um perdedor nato para o joguete competitivo do mundinho reduzido dos "homens de bem", dos filhos da puta bem sucedidos, dos "escolhidos", "the chosen one', etecetera, etecetera, etecetera.
Entretanto lá estava o puto, divagando em russo seus sonhos, alimentando Laura com espasmos de sinceridade que acompanhavam fragmentos perdidos. Emoldurava frases de Baudelaire em polonês ou alemão, isso fazia Laura impressionar-se, momentâneamente(que sacana! ele poderia fazer melhor se tivesse todo o despreendimento suicida de Vasilli). Enquanto Anatole, o pobre Anatole, filho da senhora Justine, vendedora de Nabos-farmacêutica-prostituta-suicida, não nesta mesma ordem, este pobre ser que sonha, que ilude-se com este triângulo que não existe, demora a perceber, a se "aperceber" que o lítio que o dr. avental branco recomendou durante as últimas semanas não deslocou a intrigante e deliciosa vontade de entender e usufruir deste amor doentio que só o pobre-rico Vasilli poderia às três e trinta e cinco dominar. Na verdade, sua coluna dói, sua melhor aproximação hormonal fora um olhar a trinta e cinco graus no ônibus que rodopiava a avenida rio branco, como quem gira e escapa em torno do passado... com as carruagens, com os coxeiros e o "boulevair" improvisado que o fazia lembrar a velha paris, em distintíssimos momentos diga-se de passagem.
Acendeu um cigarro e olhou para a janela, sua visão era privilegiadamente desonesta, um prédio com uma tênue luz no terceiro andar, refletia aquela decadência usual do centro da cidade.
E Vasilli, Laura, os dois, envolvidos como tumores... divisões de células não apropriadamente habituais.
Anatole pois bem, e seu cigarro, pensavam que as analogias coercitivas eram parte de um processo intenso que o levavam até a velha monografia "les configurations allemandes dans l'exécution du sade principal", era um dia quente e o decanato de literatura o observava como leões em arenas romanas.
Quanto tédio. O cigarro no fim. Laura e um orgasmo vermelho. Vasilli na cama lendo Gutiérrez ou talvez Schopenhauer antes de emendar um soneto barato que ele escrevera num momento de fleuma. Impressionismo barato.
Anatole imaginava demais. Demais. E quem pensa demais, citava-se, "precisa dormir cedo", expirou em tom de desabafo. Precisa dormir cedo.
3 comentários:
Como é a dor sem sofrimento?
brother... grande "pseudo-conto"!
imagens, imagens... vertiginosamente vasilli-anatolinianas.
um abraço!
Cara! Puta que pariu, me sinti escutando blues.. dos mais longincuos..
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